Foto: Joe Saade/ONU Mulheres (CC BY-NC-ND 2.0)
As consequências da emergência climática refletem, entre muitos exemplos, em uma maior incidência de pandemias, enchentes, deslizamentos, furacões, enfim, eventos extremos da natureza. As mulheres estão entre os grupos mais vulneráveis à crise climática em diferentes aspectos. Também são as responsáveis pelas tarefas de reprodução e de cuidados da vida. Deixando claro que isso não tem a ver com gênero, mas sim com a estrutura da nossa sociedade.
Diante disso, os mais excluídos são mais vulneráveis e tudo isso reflete em quem está nesse trabalho de cuidado. Ou seja, as mulheres. Aproximadamente 80% das pessoas deslocadas pelas mudanças climáticas são mulheres, de acordo com o relatório Women in Finance Climate Action Group. As consequências podem ser devastadoras como ao que foi recentemente divulgado no ClimaInfo que, em comunidades agrícolas no Zimbábue, jovens mulheres e crianças estão entrando na prostituição depois que secas e enchentes destruíram suas plantações e sua subsistência. Não precisamos ir tão longe, vimos durante a pandemia mulheres, de todas as classes sociais, largando seu trabalho para cuidar dos filhos e idosos da família – refletindo a economia de cuidado (trabalho, majoritariamente feito por mulheres, de dedicação à sobrevivência, ao bem-estar e/ou à educação de pessoas).
Diante destes e de muitos outros exemplos, enxergar e querer trazer soluções sem levar essa desigualdade em conta é somente tratar o tema sem a seriedade que merece para trazer soluções, de fato, efetivas. Raça, etnia, classe social, região, religião, por exemplo, podem fazer com que esses impactos da emergência climática sejam vivenciados de formas e intensidades distintas (e até mais intensas) pelas mulheres. Na verdade, estamos falando de todas as mulheres, mas que por outros fatores têm percepções e sofrem desses impactos de maneiras e intensidades diferentes.
O machismo estrutural tira mulheres até mesmo dos empregos considerados verdes. Por exemplo, segundo a Agência Internacional para as Energias Renováveis, Irena, as mulheres ocupam apenas 32% dos empregos relacionados às energias renováveis no mundo. No Brasil, as mulheres também são a minoria. Entretanto, também falta paridade de gênero nas esferas de decisão.
Ao refletirmos sobre e sob o olhar de gênero e clima é fundamental acrescentar a esta análise o como o racismo institucional, estrutural e ambiental influenciam as decisões sobre licenças ambientais, as leis de proteção ambiental e até mesmo as permissões de uso da terra. No Brasil, ainda existem os reflexos e as consequências — na estrutura da nossa sociedade — da cultura escravocrata do período do Brasil colônia. O racismo ambiental também deve ser levado em conta na análise de gênero e clima. Como explica a filósofa e antropóloga brasileira Lélia Gonzalez, o lugar em que nos situamos determinará nossa interpretação sobre o duplo fenômeno do racismo e do sexismo.
O levantamento feito pelo Fórum de Mulheres para Economia e Sociedade (WFES) apontou que três em cada quatro mulheres adotaram um novo comportamento para preservar o meio ambiente. Este protagonismo em ações regenerativas da terra está também da forma a qual nossa sociedade está estruturada. E ainda reforça a ideia de que as mulheres na nossa sociedade são as responsáveis pelo trabalho de cuidado também e não remunerado (ou muito pouco), tanto quanto elas são as mais atingidas por estarem desempenhando essas tarefas.
Há várias ações que devem ser adotadas. Desde aumentar a participação das mulheres nas esferas de decisão relacionadas às ações que serão implementadas para combater à emergência climática, políticas públicas que levem as questões de gênero e as suas interseccionalidades para aí sim trazer essa equidade; pensar no âmbito econômico; levar em conta esses impactos desiguais nas ações de mitigação e adaptação às mudanças climáticas.
Esta matéria foi originalmente publicada em ClimaInfo.