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2016 foi um ano conturbado para o povo brasileiro. Sob um disfarçado manto de legalidade, desferiu-se um solene golpe contra a democracia, destituindo um governo legítimo, apesar de caótico, eleito pela maioria do povo brasileiro. O que se buscava mesmo era entronizar nos altos escalões do poder central brasileiro um programa de governo com foco na restrição ao máximo de direitos conquistados pelas classes populares e na preservação de privilégios e lucro de quem sempre comandou os destinos de nossa nação. Outro foco era o de abrir espaço para o avanço do capital sobre pequenos nichos que ainda resistem a se incorporar e se submeter totalmente  s leis do mercado "todo poderoso". Este programa de governo se consubstancia, como se pode ver nesta edição: • Na série de Medidas Provisórias, Projetos de Lei, Propostas de Emendas Constitucionais e Decretos que afetam diretamente povos e comunidades do campo e na nomeação de pessoas para altos cargos abertamente contrárias aos direitos dos povos indígenas, das comunidades quilombolas e de outras comunidades camponesas; • na extinção de ministérios e autarquias que deviam se preocupar com os direitos humanos; e na diminui- ção de recursos e de pessoal para órgãos responsáveis por garantir algumas políticas sociais, como Funai, Incra, Grupo Móvel de Fiscalização do Ministério do Trabalho, e outros; • em mandados judiciais que enquadraram os movimentos sociais (de modo mais explícito o MST) como organização criminosa nos termos da lei 12.850/2013, como se viu em Goiás; • em procedimentos judiciais, como no seringal Capatará no Acre, em que o mandado de reintegração de posse de 2.000 hectares se estendeu para aproximadamente 7.000; e em outros casos na identificação policial de cada família expulsa ou despejada de áreas ocupadas; • na atribuição  s vítimas das agressões e violências a responsabilidade pelo conflito. Lideranças indígenas foram indiciadas judicialmente, no conflito em Caarapó, MS, onde um índio foi assassinado e outros cinco saíram feridos; • na tentativa de desqualificação das vítimas. "[Os] Trabalhadores são, em sua maioria, viciados em álcool e em drogas ilícitas, de modo que […] gastam todo o dinheiro do salário, perdem seus documentos e não voltam para o trabalho, quando não muito praticam crimes", esta é uma ilustrativa senten- ça proferida, em 2016, por uma Juíza do Trabalho de Santa Catarina contra a atuação dos fiscais do trabalho que resgataram 156 vítimas em condições análogas a trabalho escravo; na polêmica em torno  divulgação da Lista Suja do Trabalho Escravo em que a preocupação maior é como proteger os responsáveis pela exploração do trabalho em condições análogas ao trabalho escravo, não as pessoas que sofrem a exploração O Cerrado, nos lembra Carlos Walter Porto-Gonçalves, "principal área de expansão/invasão do agronegócio" ... "detém 14,9% da população rural do país, mas registrou 24,1% do total das localidades envolvidas em conflitos, o que lhes dá um índice de 1,67 ou seja, o número de conflitos é relativamente maior (67%) do que sua população". Leonardo Boff constata que "somos herdeiros de quatro sombras que pesam sobre nós e que originaram e originam a violência". São: o nosso passado colonial violento, o genocídio indígena, a escravidão, "a mais nefasta de todas", e a Lei de Terras que excluiu os pobres e afrodescendentes do acesso  terra, e os entregou "ao arbítrio do grande latifúndio, submetidos a trabalhos sem garantias sociais". 2016 transcorreu debaixo destas sombras e elas penetram implacavelmente 2017.