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News & Events O Acordo de Escazú e a posição do Brasil
O Acordo de Escazú e a posição do Brasil
O Acordo de Escazú e a posição do Brasil
Foto: Circulação
Gabriel Pensani Siqueira
Foto: Circulação

A primeira reunião da Conferência das Partes (COP 1) do Acordo Regional sobre o Acesso a Informação, a Participação Pública e o Acesso a Justiça em Assuntos Ambientais na América Latina e no Caribe — conhecido como Acordo de Escazú — começou nesta quarta-feira (20), na sede da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), em Santiago, Chile [1]. Este é um instrumento internacional cujo objetivo é dar importância da participação social, do acesso à informação e do acesso à justiça para a realização do Desenvolvimento Sustentável [2]. O Acordo teve origem na Conferência pelo Clima Rio+20, em 2012, em um momento de protagonismo brasileiro na agenda ambiental do mundo, um instrumento jurídico pioneiro voltado à proteção ambiental e à proteção dos direitos humanos [3] em uma das regiões de maior biodiversidade do mundo, mas que sofre pela violência e conflitos.

O texto não procura apenas proteger os defensores do meio ambiente, mas também reduzir os conflitos ao exigir tanto das empresas privadas, quanto dos governos que permitam o acesso à informação e à participação pública em qualquer projeto que possa ter um impacto ambiental [4]. Como ressaltado por Alicia Bárcena, Secretária Executiva da CEPAL, o Acordo busca “garantir o direito das gerações presentes e futuras a um meio ambiente saudável e ao desenvolvimento sustentável (...) Também, traduz nossas prioridades e aspirações comuns e demonstra a vigência do multilateralismo regional para o desenvolvimento sustentável” [5].

A assinatura ocorreu durante a Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova Iorque, em 2018, ainda no governo Temer, mas que seguiu durante os anos de Bolsonaro sem ser ratificado pelo Congresso Nacional por inação do Poder Executivo [6]. A não ratificação do Acordo compromete a participação efetiva do Brasil no momento em que os países participantes se reúnem em Santiago, para definir os representantes que vão compor a mesa da presidência pelos próximos 4 anos. Nesse momento, apenas 12 dos 24 países que assinaram o documento terão poder de voto, pois este privilégio será dado apenas àqueles que o ratificaram internamente.

Dentre os três pilares estruturais do Acordo, estão a exigência de compromissos dos países voltados à transparência de dados ambientais, garantias ao público e à sociedade civil o direito de participar de decisões de projetos que os afetem e a segurança dos direitos de povos da floresta, além da proteção aos defensores do meio ambiente. No entanto, quando o Itamaraty foi questionado sobre a não ratificação do Acordo alegou que poderia ferir a soberania do país e o receio de ser responsabilizado internacionalmente. Porém, essas são alegações que causam estranhamento, uma vez que o comitê não vai atuar como juiz sobre alguma violação, apenas oferecendo transparência às conclusões dos processos e promovendo orientações à ação dos países [7].

Além disso, é importante relembrar que o Brasil já possuía um bom histórico de promoção da transparência dos dados de desmatamento, com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), um centro de excelência nessa área de pesquisa, e já possuía ambientes de participação da sociedade civil nesse tipo de discussão, com o Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA), por exemplo. No entanto, o que acompanhamos durante o período Bolsonaro foi a desqualificação desses órgãos de controle e participação, além de uma escalada da violência contra os povos indígenas e seus defensores, acompanhada pelo aumento do desmatamento a níveis recordes. Por isso, não é de se espantar a falta de encaminhamento da ratificação do Acordo pelo nosso mandatário, bem como seu receio pelas eventuais cobranças e consequências pelos seus atos. Dessa forma, vivenciamos mais um triste episódio na história da agenda ambiental brasileira, com o apagamento de seu protagonismo e a negação aos principais defensores da floresta pela falta de apoio institucional.

Referências

1 - GRAZIANI, P. Governos dão início à caminhada do primeiro tratado ambiental da América Latina e do Caribe. Nações Unidas, 22 de abril de 2022. Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/178975-governos-dao- inicio-caminhada-do-primeiro-tratado-ambiental-da-america-latina-e-do-caribe. Acesso em 25 de abril de 2022. 2 - CEPAL, N. U. Acordos. Terceira Reunião do Comitê de Negociação do Acordo Regional sobre Acesso à Informação, Participação Pública e Acesso à Justiça em Assuntos Ambientais na América Latina e no Caribe. 2016.
3 - VIANA, A; RIBEIRO, S. O Acordo Escazú e a educação ambiental como ferramenta. Nexo, 26 de julho de 2021. Disponível em: https://www.nexojornal.com.br/ensaio/2021/O-Acordo-de-Escaz%C3%BA-e-a- educa%C3%A7%C3%A3o-ambiental-como-ferramenta. Acesso em 25 de abril de 2022.
4 - MIGUEL, T. Acordo de Escazú entra em vigor para frear mortes de ambientalistas na América Latina, sem participação do Brasil. El País, 23 de abril de 2021. Disponível em: https://brasil.elpais.com/internacional/2021- 04-23/acordo-de-escazu-entra-em-vigor-para-frear-assassinatos-de-ambientalistas-na-america-latina-sem-a- participacao-do-brasil.html. Acesso em 25 de abril de 2022.
5 - BÁRCENA, A. O Acordo de Escazú: uma conquista ambiental para a América Latina. Eco 21, S/D. Disponível em: https://eco21.eco.br/o-acordo-de-escazu-uma-conquista-ambiental-para-a-a.... Acesso em 25 de abril de 2022.
6 - Transparência Internacional. Acordo de Escazú. S/D. Disponível em: https://transparenciainternacional.org.br/acordo-de-escazu/? fbclid=IwAR1wvnbIbVcyfMOd06KFnC4BMI3aOddcNbIMCrlO7xe-s62PMQ5gORRSjr8. Acesso em 25 de abril de 2022.

Blog originalmente publicado no  IGTNews No. 48