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Nos últimos anos, o governo brasileiro reverteu as proteções ambientais e sociais, ameaçando ecossistemas como a floresta amazônica e a subsistência de povos indígenas e comunidades tradicionais. O desmantelamento dos programas de fiscalização e proteção em territórios indígenas, aliado ao descaso político com a demarcação formal das terras indígenas ou o fortalecimento das políticas públicas de salvaguarda dos modos de vida tradicionais, tem gerado vulnerabilidade social, física e cultural para os povos indígenas. A região amazônica, principal foco deste relatório, também sofreu os maiores índices de desmatamento e queimadas nas últimas décadas.
Com a eclosão da nova pandemia de coronavírus, as ameaças enfrentadas pelos povos tradicionais e seus territórios se intensificaram. Guiado por um discurso negador sobre a gravidade da pandemia e os métodos adequados para enfrentá-la, como o isolamento social, o governo do atual presidente Jair Bolsonaro não adotou medidas eficazes para retardar a disseminação da COVID-19 entre os povos indígenas e comunidades tradicionais. Pelo contrário, o governo tem agido com impunidade em relação ao aumento das invasões, a exploração ilegal de recursos naturais e a grilagem de terras em territórios indígenas. Essa impunidade resultou em maior exposição ao vírus e, conseqüentemente, na morte de muitas centenas de pessoas. Além disso, o governo Bolsonaro explorou intencionalmente e de forma proativa a pandemia para promover sua agenda econômica em detrimento dos direitos dos povos indígenas.
Como estudos de caso ilustrativos de problemas de nível nacional, este relatório se concentra em duas comunidades de povos indígenas localizadas na bacia do Médio Xingu, na região de Volta Grande do Xingu. Esta região também abriga dezenas de espécies endêmicas de peixes ornamentais e rica biodiversidade. Há mais de uma década, a população da região de Volta Grande do Xingu é impactada pela construção e operação da Usina Hidrelétrica Belo Monte. A operação da usina reduziu em 80% a vazão natural do rio Xingu neste trecho que abriga várias terras indígenas e centenas de famílias e comunidades ribeirinhas que praticam a pesca e a agricultura tradicionais. A redução do fluxo de água representa um sério risco para a segurança alimentar dessas populações, levando à diminuição do abastecimento de peixes, principal alimento básico para as famílias, e da água para irrigação. Essas vulnerabilidades existentes foram agravadas pelo surgimento da nova pandemia de coronavírus, e os conflitos entre os povos indígenas e Belo Monte pioraram durante a crise.
Apesar de enfrentar situações adversas, os povos indígenas, comunidades tradicionais e organizações da sociedade civil têm trabalhado para reverter os retrocessos ambientais e sociais do governo e defender os territórios indígenas, direitos e ecossistemas florestais. Alguns exemplos desses movimentos coletivos e interinstitucionais estão descritos neste relatório com o objetivo de apontar soluções para esses graves problemas que afetam todo o planeta, dado o papel fundamental da Amazônia no combate às mudanças climáticas globais. Para o bem da sobrevivência da humanidade, é essencial que o conhecimento tradicional dos povos indígenas que vivem em harmonia com seus ecossistemas seja considerado como guia para a tomada de decisões por organizações internacionais e governos nacionais.