Clima tenso na disputa por terras (Brasil)
O problema da regularização fundiária no Brasil já é grave e antigo. Considerado um dos piores tumores da reforma agrária do País. Em Rondônia, as coisas pioram. O Estado é o retrato do caos e centenas de mortes no campo. Constatando essa cruel realidade, só em 2015, o Estado registrou o maior número de assassinatos desde 1985, quando a Comissão Pastoral da Terra (CPT), calculou 21 mortos. Para se ter uma ideia, de quão alto é o número, as mortes no Estado representam 30% do total de assassinatos por conflito de terra no País, segundo a CPT. Em Rondônia existem mapeadas cerca de 88 áreas de conflitos, envolvendo mais de 4,6 mil famílias.
Para tentar buscar uma solução para os conflitos de mais de 20 áreas que estão em situação emergencial no Estado, com reintegração de posse em aberto, a Liga dos Camponeses Pobres de Rondônia (LCP), enviou ao ouvidor agrário nacional, Jorge Tadeu Jatobá, no último dia 4 de abril, um pedido para que o assentamento dessas áreas pudesse ser resolvido o mais rapidamente possível.
Na reunião, foram discutidas as melhores formas para agilizar os processos de criação de projetos de assentamento pelo Incra nas terras da fazenda Cauã/Galhardi, em Theobroma (acampamento Raio de Sol), fazenda Arrobas/Só Cacau, em Ariquemes (acampamento Canaã), sítio Marcolino, em Ariquemes (acampamento Zé Porfírio), fazenda Riacho Doce, em Seringueiras (acampamento Paulo Freire) e fazenda Jarucred, em Machadinho do Oeste (acampamento Gonçalo).
Por exigir maior atenção do Programa Terra Legal – realizado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário do Governo Federal -, bem como do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária do Estado (Incra), o ouvidor agrário nacional, Jorge Jatobá, transferiu a pauta de discussão para Rondônia, onde desde quarta (10) se reúne com o Incra, representado pelo seu superintendente Cletho Muniz de Brito, com a Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário de Rondônia (Sead), na figura do subsecretário, Sonrival Lima e com a Liga dos Camponeses Pobres, que tem como líder, José Fonseca de Souza, o “Pelé” e a advogada Lenir Correia que defende os interesses da LCP.
Instituto busca saída rápida
A reunião se estendeu ao longo do dia de ontem (11), por se tratar da discussão das 22 áreas a serem assentadas, tendo desde a manhã de ontem, camponeses acampados na sede do Incra esperando que o órgão resolva a regularização de suas terras. O superintendente do Icra, Cletho Muniz de Brito, não esteve na reunião, pois viajou a Brasília para tentar buscar uma solução mais rápida para esse impasse. No seu lugar, o superintendente substituto, Erasmo Tenório da Silva, que mediou a reunião junto à LCP para tratar da situação das 22 áreas, tanto dos processos judiciais que têm reintegração de posse em aberto, como também das situações administrativas de aquisição, desapropriação ou mesmo compra das áreas destinadas à reforma agrária. A expectativa era de que até o final do dia, fossem encaminhadas as decisões e providenciadas às devidas resoluções dos conflitos.
Menos recursos para assentamentos
Lenir Correia, advogada da LCP explica o objetivo da pauta de reunião, onde segundo ressalta, os agricultores foram convocados para que tenham uma resposta para cada área. “Paralelo a isso, o grupo de trabalho técnico de Conflitos Agrários do Estado de Rondônia, que trabalha 106 áreas, está aqui no Estado e se comprometeu de vir hoje à tarde dar uma resposta à demanda apresentada, pelo menos que seja de encaminhamento”, reforça a advogada.
“Está sendo discutido acampamento por acampamento o que o Incra tem feito ou não, de competência do Terra Legal ou não, sobre destinar as áreas aos camponeses e fazer o projeto de assentamento para assentar essas famílias e resolver a situação da terra. O que tem acontecido nos últimos tempos, é o corte de recursos do Incra, o sucateamento do mesmo, que é fato concreto, mas diante do quadro que está sendo exposto, o ouvidor agrário nacional tem mostrado boa vontade em intermediar isso e os casos críticos que realmente demandam um recurso maior financeiro, está sendo negociado e vendo a possibilidade de se obter esse recurso, quer no caso, de aquisição, quer no caso de desapropriação. Há algumas situações que não envolvem dinheiro, que são as áreas do Incra, onde ele precisa fazer somente a ação de retomada, que é uma área que já é dele e assim, só precisa agilizar o processo judicial e a procuradoria para que ele tome posse daquilo que é seu e destine para os camponeses”, explica ainda.
Lideranças sofrem ameaças de morte
“Boa parte das lideranças e coordenações estão sendo ameaçadas de morte. Há uma sistêmica concreta e real de policiais envolvidos na qualidade de pistoleiros em áreas, tanto que hoje, vai ter uma pauta específica com o delegado agrário”, denuncia ainda Lenir Correia.
Os agricultores dos acampamentos Canaã (cerca de 60 quilômetros de Ariquemes), Seu Nivaldo Ferreira Alves de 40 anos e Seu Laurir Qirchhein, 48 anos, estão acampados desde quarta-feira (10) aguardando um posicionamento do Incra para que suas famílias possam ter uma resposta concreta sobre suas terras e exigem uma solução para os conflitos no Canaã.
Nivaldo Ferreira explica como o impasse começou
“Esse processo começou desde 2002, e dessa época pra cá, a Polícia Militar fez cinco despejos lá dentro do acampamento. Só que na época, a pessoa saía e tinha um prazo de 24 horas e podia voltar pra área. Agora existe uma lei que quando a pessoa sai, ela não pode mais voltar. Foi aí que o impasse começou. De 2008 pra cá, não teve mais despejo, só ameaças”.
Segundo Nivaldo, três ônibus lotados de trabalhadores rurais vieram para a reunião. Conforme ele diz, “o governo determinou que o Exército tirasse o povo de lá. Só que o Incra sempre determina prazo, mas nunca cumpre os prazos. No dia que ‘estamos’ aqui, ele faz a proposta e depois engaveta tudo de novo, e hoje nós estamos reunidos novamente para que eles possam nos passar uma decisão concreta. Queremos que isso seja resolvido logo, porque o pessoal de lá está correndo o risco de ser despejado. Nós queremos evitar uma coisa pior, porque se o Exército entrar lá, vai dar morte, vai ser tudo destruído, certeza que vai”. “Já procuramos o governo do Estado, o Ministério Público, agora o Incra, o Terra Legal, para que possamos chegar a um acordo e evitar um massacre”, destaca Nivaldo Ferreira.
“Nós estamos numa situação de quem tem filho estudando, nossos filhos irem pra escola, e ao chegar em casa, está todo mundo “ao deus-dará”. Nós temos porco, galinha, cacau, café, banana, nós temos casa, curral, e estamos há mais de 15 anos nessa luta e ninguém resolve nada. O que eu soube ontem é que já tinha R$ 120 mil em caixa depositados, para tirar o povo de lá com a Força Nacional. A nossa preocupação é de que nada se resolva. Ficaremos acampados aqui até resolver nosso problema. E se não resolvermos, podemos até “fechar a BR”, porque desse jeito não podemos ficar”, diz Laurir Qirchhein.
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