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O Pacto para a Melhoria da Governança da Terra na CPLP
23 Abril 2017 to 11 Maio 2017
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Olá a todos, 

Partilho-vos um resumo de um documentário intitulado " De quem é a terra?", produzido pela Quebra Cabeça Filmes para o Grupo de Governança de Terras da Unicamp.

O vídeo foi publicado hoje, mas como referi, é apenas um trailer, mas dá-nos uma perspetiva muito geral sobre as questões de terra no Brasil que precisam de ser melhor abordadas por todas as entidades para garantir não só uma diminuição nos conflitos, mas também a segurança e a atribuição legal de terras de forma justa.

Deixo aqui o meu contributo para esta discussão: 

 

 

Os princípios da boa governação da terra para que sejam conhecidos e compreendidos é necessário instaurar um mecanismo de abordagem participativa pela via do dialogo e concertação entre o topo e a base. 

Esquema 

O dialogo entre o topo e a base vai facilitar a passagem de informação entre as diferentes ´´forças´´ da sociedade e desta maneira as correntes dialogantes discutem a melhor forma de valorizar a participação de cada actor. Nessa base os princípios da boa governação da terra são discutidos e cada parte engajada na dinâmica auto assume a sua participação nesse processo. O resultado do dialogo é traduzido num ´´pacto´´ entre as partes envolvidas.

A existência de uma plataforma é absolutamente vital para garantir um dialogo permanente entre as partes. A estrutura dessa plataforma deve ter a representação de todos os actores acima indicados.

Na Guiné-Bissau está em marcha a configuração de estruturação do CONSAN. Nesta estrutura estão representados todos os actores (Governo, ONGs, Sociedade Civil, OC``Organizações Camponesas´´ ). As sessões de trabalho do CONSAN poderiam se orientar a volta de recolha, classificação, debate de dados, informações e noticias sobre a governança da terra. 

 CONSAN pode delegar poder de representação para RESSAN/GB que é já uma rede bem estruturada na temática de Segurança Alimentar e nutricional. Esta temática e a questão da terra estão intimamente inter relacionadas e por isso mesmo entre elas pode haver uma interacção benéfica entre as partes e com um efeito de sinergia positivo para a melhoria da governança da terra.   

A nível local/ nacional CONSAN poderia receber o mandato de avaliar e reportar a adoçao e implementação de princípios das VGGT.

Madi Fati

Présidente de COMAF

Guine-Bissau

 

Como tem vindo a ser sublinhado em diferentes contributos a este debate, as Diretrizes Voluntárias da Governança Responsável da Terra, dos Recursos Pesqueiros e Florestais no contexto da Segurança Alimentar Nacional, aprovadas por unanimidade em 2012, no Comité Mundial de Segurança Alimentar (CSA), podem assumir um papel central na garantia do acesso seguro e equitativo à terra, a partir de uma abordagem de direitos. 

 

Reconhecendo a importância desta ferramenta, aprovada, sublinho, por unanimidade, faz-se imprescindível o monitoramento da implementação destas Diretrizes em todos os países da CPLP. 

 

Um Pacto multi-atores, envolvendo governos, sociedade civil, universidades, parlamentares, setor privado, poder local, deveria, em nossa opinião, partir precisamente de um monitoramento muito sério, transparente e efetivo da implementação destas Diretrizes e da possibilidade de acionar diferentes Diretrizes (como Caio França bem tem ilustrado neste Debate). 

 

Para tal, como acaba de ressaltar Madi Fati, do Comité Nacional da AF na Guiné Bissau, é vital a existência de uma plataforma que garanta um diálogo permanente entre as partes a nível nacional. Também a nível regional (CPLP), reunidos numa plataforma de diálogo, negociação e estabelecimento de consensos, os diferentes atores poderiam assim contribuir para uma “governação da terra com objetividade avaliativa", como sublinhou Xavier Mendes, do Mecanismo dos Parlamentares da CPLP, durante o FAFSAN II, e assim reduzir, inclusive, potenciais conflitos de interesse - como evidenciado por Manuel Consolo, da REDSAN-CPLP, os conflitos de interesses surtem um impacto negativo tanto da implementação da legislação, quanto no desenvolvimento económico do país; assim, tal como coloca, é imprescindível um “controle social abrangente envolvendo os vários sectores e instituições da sociedade e não simplesmente numa perspectiva estrita e exclusivamente jurídico-legal”. 

 

 

Em conformidade com contributos recebidos, esta Plataforma regional multi-atores deveria priorizar: 

 

i) a recolha, sistematização e disseminação de informação (observatório?), concretizando-se num espaço de reflexão, diálogo e alerta sobre casos de violação das Diretrizes aprovadas (ver contributo de Maria Rita, do Mecanismo das Universidades); 

 

ii) a operacionalização e o monitoramento efetivo da própria implementação das Diretrizes Voluntárias sobre a Governança responsável da Terra, assim envolvendo e estimulando a participação de todos os atores relevantes na governança fundiária na região (ver contributos de Francisco Sarmento, FAO e de Caio França, especialista neste debate); 

 

iii) a negociação e proposta de políticas, programas e estratégias relevantes (ver contributo de Paolo Groppo, FAO).  

 

 

Poderia esta Plataforma operacionalizar-se a partir de um Grupo de Trabalho sobre Governança da Terra, a ser criado no âmbito do CONSAN-CPLP? Afinal, esta Plataforma poderia contribuir para o tão esperado Pacto multi-atores e, consequentemente, para a própria dinamização da ESAN-CPLP, como bem coloca Luis Muchanga, da Plataforma de Camponeses da CPLP. 

 

Um dos elementos centrais que Paolo Groppo bem destaca é a imprescindibilidade de, além de uma aliança entre atores, garantir o papel de alguém com um nível de aceitação maior, que pudesse fazer “esse trabalho de abrir portas e empurrar, democraticamente, os governos e demais setores poderosos, a abrir mão ao jogo democrático”. Nesse sentido, poder-se-ia pensar a possibilidade de um Relator regional que pudesse assumir esse papel

 

Aguardamos, com expectativa, comentários as questões levantadas! Abraços, jo

Prezada Adriana,

Muito obrigado pelo seu contributo pretinente e actual.

De facto, esse trailer está muito bem enquadrado com a temática do debate e, por acaso, deixa-nos bastante curiosos relativamente a quando e onde o documentário integral será publicado.

Cremos que esse instrumento audiovisual seria muito interessante de assitir e certamente irá transmitir ainda mais comentários de grande valor para as questões de terras no Brasil.

Uma vez que nesse trailer aparecia um excerto com o Professor Doutor Bastiaan Reydon, creio ser de seu interesse, bem como de toda a comunidade, a divulgação de uma entevista efetuada ao professor, em que é apresentada uma aprofundada análise ao panorama do desenvolvimento económico no brasil e a sua relação com as questões de governança de terras.

Fica aqui a entrevista para visualização: 

 

Com os nossos melhores cumprimentos,

P'lo Secretariado da REDSAN

1.Na Republica da Guiné-Bissau a terra e’ propriedade do Estado e património comum de todo o povo.

2.A terra como suporte físico fundamental da comunidade e’ valor eminentemente nacional, qualquer que seja a forma da sua utilização e exploração.

3.Os direitos constituídos sobre a terra e sobre os recursos naturais importam em igual protecção quer resultem do costume, quer da lei.

 

Como se pode entender a lei fundiária do nosso país é extremamente controversa e deixa lamentavelmente um campo aberto para o surgimento de muitos conflitos de posse de terra. Os conflitos fundiários são frequentes tanto nas zonas rurais como nos centros urbanos. Os casos mais graves são os conflitos que opõem os Agricultores contra os criadores de gado.  

Na Guiné-Bissau o grupo étnico fula é criador de gado por excelência. Os fulos são uma população islamizada e vivem fundamentalmente no leste do país (Regiões de Gabú e Bafatá). O leste é uma zona agrária árida ou aquilo que chamamos contexto saheliano. Eles são detentores de maior número de cabeça de gado. No entretanto a zona leste devido as condições de aridez climática o gado confronta-se com graves problemas de alimentação. Isto obriga a população fula a praticar a transhumancia do gado. Nessa pratica da transhumancia o gado é movimentado do leste para a Região de Oió a procura de pastagem. Nessa movimentação o gado frequentemente passa pelos arrozais de grupos étnicos balanta. Os balanta e fulas opõe uns contra outros e os conflitos fundiários (travessia de arrozais) tem originado confrontos físicos que culminaram em espancamentos até a morte. 

O foco das violências entre agricultores e criadores de gado é frequente no norte na Região de Oió (Gã- Mamudo, Bissorã)  

Em Bissau no bairro de Gabúsinho surgiu um conflito de terra entre um estrangeiro e alguns moradores deste bairro.

O estrangeiro adquiriu um espaço de terra através de um ocupante tradicional e aproveitou a documentação para legalizar esse espaço. Ele não tendo no imediato intenção de construir nessa localidade deixou o terreno com plantação de cajueiros e regressou para o seu país. Quando voltou anos depois deparou com a situação de ocupação do seu terreno com construção de habitações de tipo precário. Ele fez recurso á Instancias judiciário e ganhou a causa. As autoridades (Câmara Municipal de Bissau, Policia Judiciaria) deram ordem de despejo aos ocupantes e posteriormente mandaram demolir essas habitações. Isto aconteceu em 2016. Há casos de violência frequentemente que por vezes são fatais.

O desfecho dos conflitos termina normalmente com a intervenção das autoridades costumeiras locais que de princípios de solidariedade comunitária conseguem persuadir as partes para uma solução negociada tradicionalmente.



 

 

 

Na Guiné-Bissau a terra é um problema extremamente crucial no país. Não se pode neste momento falar em governação de terra porque a lei fundiária aprovada em 1998 até agora ainda não está a ser aplica, muito embora o governo tenha solicitado à FAO que fizesse a revisão do regulamento da lei. Esta já foi feita e entregue ao governo para que possa ser aprovada e assim começar a implementar essa lei. O documento permite a criação de diversas instituições que vão regular a questão de terra.

Neste momento a governação de terras não existe. Quando se quer investir o investidor vai junto às aldeias, contacta o chefe da aldeia e ele vê o espaço que está livre ou não e concede esse terreno. Depois vai à administração regional e faz as escrituras. Muitas das vezes, essas terras podem ser de alguém dos antepassados das famílias e poderãoexistir conflitos.

Outra questão são os problemas que existem entre duas aldeias. Portanto, há terras que pertencem a duas aldeias, uma reivindica uma parte e no final criam-se conflitos, muitas vezes com vítimas mortais.

No que respeita o acesso à terra das mulheres, elas não têm direito a posse de terra. Mesmo sendo viúva, não pode herdar a terra deixada pelo marido.

As VGGTs foram aprovadas pela FAO e com este projeto procura fazer-se a implementação das diretrizes no país e como é que a questão de governança pode ser abordada melhor no país. O projeto tem diversas vertentes, sendo uma delas o reforço das capacidades de as instituições trabalharem à volta da terra. Dentro do regulamento da lei está prevista a criação das comissões fundiárias a nível nacional, das regiões e sectoriais. Uma das componentes do projeto é reforçar essas comissões que vão gerir a questão da terra. As terras comunitárias não estão delimitadas, identificadas ou cadastradas. Então é necessário que isso seja feito para que posteriormente haja melhor controlo de acesso e posse de terra.

Outro elemento é o reforço da capacidade da estrutura dos impostos, para que seja aplicado o imposto sobre a terra. Neste momento não se paga praticamente imposto sobre a terra (montante muito pequeno que é pago) e mesmo assim muitos proprietários não pagam e não cumprem com o dever de o pagar. Portanto, o projeto permite criar mecanismos para que se possa criar um observatório fundiário de terra para que possa recolher todas as informações ligadas a tudo do fundiário na Guiné Bissau.

A comunicação, a troca de informação entre os diversos atores a nível nacional, a nível regional e internacional permite ver qual o avanço nesta questão de governança da terra e trocar as experiências que poderão existir. As informações têm de ser vinculadas e aplicadas nas comunidades porque são elas que têm o saber, o conhecimento e o poder de trabalhar a terra. Todo este processo terá que ser divulgado e partilhado a nível internacional para melhorar o acesso à terra na Guiné Bissau.

Para aprofundar o debate, junto o link para o video da 1ª Mesa Redonda do II FAFSAN, sobre Governança da Terra na CPLP, onde podemos assistir aos contributos de Vicent Garcéz - Presidente do Comité Internacional Organizador do Fórum Mundial sobre Acesso à Terra e aos Recursos NaturaisFrancisco Sarmento - na altura Consultor da FAO, Luís Muchanga - Coordenador Executivo da UNAC - União Nacional de Camponeses (Moçambique), membro da Rede de Organizações para a Soberania Alimentar (ROSA) de Moçambique e Representante do MSC-CONSAN, de Maria Rita Oliveira - Docente da Universidade Estadual Paulista (UNESP) do Brasil e Representante do Mecanismo das Universidades no CONSAN-CPLP, de Salimo Abdula - Presidente da Confederação Empresarial da CPLP e Representante do Mecanismo do Setor Privado no CONSAN-CPLP, de Xavier Mendes - Parlamentar (São Tomé e Príncipe) - Representante do Mecanismo dos Parlamentares no CONSAN-CPLP, e de Manuel Lapão - Diretor de Cooperação do Secretariado Executivo da CPLP.

Mesa redonda 1 - Governança da terra e outros recursos naturais

Na plateia, de entre outros intervenientes, referimos as contribuições de Margarida Alvim da FEC – Fundação Fé e Cooperação, de Boaventura Monjane – jornalista e ativista social em Moçambique; faz doutoramento no CES em Póscolonialismos e Cidadania Global no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, Portugal, tendo como área de pesquisa os Movimentos Sociais, questões agrárias e as alternativas desde a base. Fez parte da equipa de advocacia da UNAC (Moçambique), e de Marina Padrão Temudo – Investigadora do Instituto de Investigação Científica Tropical – trabalha com saberes, conhecimento, gestão recursos naturais, na Guiné, Moçambique, Cabo Verde, Angola.

Ver aqui: Mesa redonda 1 - Governança da terra e outros recursos naturais

“É conhecido como as políticas de reforma agrária, que decorreram em todo o planeta no século XX, a finais do século XX desapareceram do cenário internacional na medida em que há medidas de orientar a sociedade e de redistribuição da terra, facilitar o acesso à terra para os camponeses no campo ou com pouca terra “que permitiram a produção agrícola suficiente para a alimentação do país.”

As últimas décadas caracterizam-se pelo rápido desenvolvimento tecnológico e pelo forte incremento na utilização de combustíveis fósseis, resultando numa extensão generalizada das economias de mercado. Contudo, também emerge uma revolução financeira que resulta na compra de uma grande quantidade de terras. Portanto, a transformação das estruturas agrárias pode resultar num decréscimo acentuado ou até na ausência de camponesas, já que as grandes empresas irão empregar os trabalhadores agrícolas. A este ritmo, é cada vez mais possível acabar com os camponeses, alterando e condicionado a sobrevivência da humanidade como a conhecemos.

“As políticas do mercado de terras substituíram as políticas da reforma agrária e modificaram a orientação para se irem submetendo cada vez mais à terra como mercadoria, como um valor para a inversão.”

“Em 2006, mais de 90 governos de todo o mundo subscreveram as conclusões da CIRADR (Conferência Internacional de Reforma Agrária e de Desenvolvimento Rural) de concordaram que era necessário reformular as políticas de redistribuição de terras, para fortalecer a agricultura, agricultura camponesa, agricultura familiar e a produção de alimentos. Foi dito também que é necessário fortalecer todos os mecanismos de articulação com a sociedade civil que permitam uma melhor conexão entre os grandes desafios e exigências da sociedade camponesa e as instituições públicas. Afirmou-se também que o papel das mulheres e dos jovens é fundamental para o desenvolvimento agrário e é necessário haver políticas ativas para limitar ou eliminar as restrições que diferenciam, em muitos países, a mulher do mundo rural, do homem e que limitam aos jovens o acesso às possibilidades de produção.”

Em 2016, constata-se que as políticas de redistribuição da terra foram praticamente abandonadas e as que foram estabelecidas não tomam em conta a realidade local das comunidades de base. A falta de acesso à terra e aos recursos produtivos continua a ser uma das principais causas da pobreza e da marginalização das populações rurais e do mundo. A apropriação por parte dos órgãos com mais poder das melhorares terras agrárias, da água, espaços florestais e pastorais, da pesca e das sementes leva ao aumento das desigualdades sociais e das dificuldades económicas.

Há mais de 30 anos que as grandes empresas agrícolas, atraídas pelos bons preços da terra e mão-de-obra barata ganham terreno em detrimento das pequenas explorações familiares e camponesas. “Assim, hoje, os recursos naturais são considerados como mercadorias em detrimento do meio ambiente, da soberania alimentar e do direito dos povos à alimentação”. As grandes empresas privadas continuam a beneficiar do muito baixo custo do acesso à terra, dos salários, dos recursos naturais, dos baixos salários e da ausência fiscal para gerar somente benefícios financeiros, não contribuindo, contudo, para uma maior eficácia agrónoma e económica, no que respeita a produção industrial.

Por outro lado, o foco na monocultura com utilização massiva de energia fóssil e de fertilizantes de origem industrial, com risco acrescido de contaminação de solos e água contribuem para a perda de biodiversidade, degradação ecológica e alterações climáticas. Mais, promove a persistência de fome e malnutrição, desigualdades crescentes entre países, exclusões sociais, violências estruturais, altos níveis de desemprego e fluxos migratórios. Esta situação é intolerável e afeta especialmente os povos indígenas, as mulheres e os jovens.

Por isso, as VGGT são decisivas para colmatar a falta de vontade política dos Estados e para assegurar a posse justa e legal de terra, o reassentamento de populações cujas terras tenham sido injustamente exploradas e não compensadas adequadamente, para corrigir as desigualdades no acesso à terra e aos recursos naturais, para reconhecer e garantir a participação eficaz das mulheres e dos jovens na tomada de decisões, estabelecer ferramentas de regulação para controlar a posse de terra, nomeadamente políticas fiscais, intervenção, venda ou arrendamentos em mercados de terras e promover a governança dos territórios , garantindo que as comunidades definam as regras e direitos de uso dos seus bens comuns e  modos de vida melhor conformados às suas preferências técnicas, ecológicas, económicas e culturais.

O acesso seguro à terra e aos recursos naturais depende da realização eficaz dos direitos humanos como: o direito à alimentação e nutrição adequada; o direito à água e ao saneamento; o direito à saúde; o direito à cultural; o direito à vivência e o direito ao trabalho.

Importância do quadro institucional para participação dos atores na governança da terra, para construir pontos de concordância e sinergias: “Faz parte da Estratégia da Confederação Empresarial da CPLP, o sector agroindustrial, que é o sector principal que elegemos como um dos fatores principais para desenvolver o sector económico e também social a nível dos países de expressão portuguesa. Tendo em consideração o que temos afirmado sobre o crescimento populacional da classe média a nível mundial, precisa de se alimentar mais e melhor e a CPLP pode olhar para este fator não só como um aspeto social mas também económico”

“É uma grande oportunidade para intervenção das empresas nos nossos países com uma combinação de esforços, para países como Portugal, Brasil que têm mais tecnologia e os outros países dos PALOP como angola e que precisam desta tecnologia para trabalharem a terra que abunda, mas vale zero se não for produtiva.”

“Acho que as organizações existentes, regionais e locais, devem ser utilizadas da melhor forma para não proliferarem outras instituições onde vamos queimar só tempo, energia e recursos que são escassos e podemos maximizar aproveitando todos os atores intervenientes neste processo para poderem sempre dar mais um passo e avançar para o grande objetivo que queremos: maximizar o tempo, maximizar os recursos existentes e sermos certamente uma comunidade que vai oferecer a este planeta uma solução alimentar e uma solução social também”

“Temos que crescer comercialmente, temos que usar a terra, mas de forma responsável. O passado pode ser o grande professor. Podemos minimizar os impactos negativos que foram utilizados anteriormente. Hoje as tecnologias podem ser mais previsíveis para que possamos fazer uma agricultura mais responsável, mais amiga do ambiente, mas que possa também maximizar, dentro dos PALOPs este grande recurso que temos que é a terra.

Há que haver transparência na concessão dos espaços para produção. É crucial para os países que detém grandes espaços territoriais e que os querem usar para a produção agroindustrial, devem mapear e ter de forma bem organizada aquilo que são as zonas de produção agrícola industrial, aquilo que é para produção familiar, para que haja transparência na aquisição. O sector privado quando chega quer pagar, quer produzir, quer maximizar o seu tempo. Não pode andar à procura e a perder tempo porque depois entramos num sistema corrupto em que saímos todos a perder. Portanto, os produtos saem mais caros, não há investidores sérios e entramos no que não queremos. Queremos é que haja um espaço transparente, transversal, onde todos possam produzir de forma legal, contribuir com as suas contribuições fiscais e provoque o desenvolvimento social.

Olá a todos,

De facto, os comentários tecidos pelo professor Bastiaan estão muito bem explicítos e demonstram a relação entre o desenvolvimento económico e a governança de terras.

Embora não seja atual, a entrevista a Sofía Monsalve, neste link: http://radiomundoreal.fm/Perfurando-o-silencio-global-sobre?lang=es, demonstra que se conseguir protejer a posse dos recursos naturais por parte dos trabalhadores e trabalhadoras rurais, é possível assegurar uma diminuição da criminalidade, contribuir para a segurança alimentar e nutricional das comunidades e, claro, assegurar o desenvolvimento económico.

Este esforço só é conseguido quando há a devida articulação do sector privado com os Governos e com a sociedade civil, havendo uma distribuição equitativa dos benefícios. Isto implica, claro, não lesar nenhum dos actores e primar pela preservação do ambiente, dos recursos naturais e das comunidades.

Mais, quando há uma falha na distribuição destes poderes e capacidades, o sector agrícola, mais propriamente os agricultores e agricultores saem sempre em situação desvantajosa, o que é muito preocupante a uma escala global, uma vez que grande parte da população dos países em desenvolvimento depende do sector primário.

Provavelmente não serei das pessoas mais entididas na matéria, mas creio ser fundamental assegurar que este garanta impactos de longo prazo, duradouros e eficazes, essencialmente para as comunidades locais.

 

Os debates e elaborações relativos à governança fundiária e à construção de agendas internacionais de políticas voltadas ao desenvolvimento devem necessariamente buscar a solução para problemas estruturais da humanidade como, a concentração das terras, os problemas ambientais e a fome no mundo.

Nestas discussões, tem sido cada vez mais relevante o reconhecimento do papel da agricultura familiar e camponesa como o setor que pode responder pela produção de alimentos saudáveis, geração de empregos e ocupações produtivas, proteção da biodiversidade e para a produção e reprodução da vida no campo, assegurando a construção e valorização das identidades étnico-culturais. Esta visão sobre o papel da agricultura familiar questiona a priorização do agronegócio monocultor, extrativo e exportador, que compreende o campo apenas como local para aumentar suas riquezas, sem qualquer preocupação com o abastecimento alimentar da população e nem em resguardar os bens da natureza.

No entanto, mesmo com avanços importantes na defesa da terra como local de produção e reprodução da vida, intensifica-se a concentração deste bem pelo capital no mundo inteiro, num brutal processo de privatização que resulta na expulsão das populações locais e no agravamento das históricas situações de degradação, violência, êxodo rural e migrações.

A apropriação das terras, territórios e demais bens comuns pelo capital vem ocorrendo de diversas formas, como: pela intensificação do controle de áreas públicas por tradicionais mecanismos de grilagem, ou pela obtenção de concessões de uso em contratos de longuíssimo prazo com renovações indeterminadas; a compra de terras dos pequenos e médios produtores; tomada de terras de populações indígenas, quilombolas e de outros povos e comunidades tradicionais e pela submissão dos agricultores familiares à lógica produtiva do agronegócio, dentre outras. 

O interesse internacional sobre o monopólio dos bens naturais resulta da intenção cada vez maior de exercer o controle sobre as principais demandas mundiais conhecidas como 4 F, que significam: Food - alimentos; Feed/Fiber – ração/fibras; Fuel – combustíveis/agro- energias e Forest – florestas/madeiras.  Também estão nesta lista de demandas, a exploração de minérios, de madeiras e o controle da água para consumo, produção de alimentos e energia.

O Brasil pela abundância de terras agricultáveis, água, florestas e minérios, está no centro deste interesse mundial, sendo disputado por grandes empresas, mineradoras, fundos de pensão e governos de países ricos, especialmente daqueles que possuem poucas terras agricultáveis e precisam de reservas para produção futura de alimentos.

Destaca-se que parte expressiva do parlamento e do atual governo brasileiro defendem a abertura total das terras ao capital internacional, sem se preocupar com as consequências desta medida que, somada à opção política de fortalecer a agricultura exportadora controlada pelas companhias transnacionais do agronegócio coloca a economia e o desenvolvimento brasileiro totalmente subordinado e influenciado pelo mercado global de commodities.

Vale lembrar que esta opção de desenvolvimento rural faz do Brasil um dos países com a estrutura fundiária mais concentrada e o que utiliza maior quantidade de agrotóxicos do mundo, sem contar a disseminação do uso da transgenia em quase todas as culturas mais relevantes.  Estas são estatísticas que afetam profundamente a vida, o trabalho, a renda, a saúde e as culturas dos povos do campo, da floresta e das águas, agravando as situações de desigualdade, desterritorialização, degradação ambiental e de exclusão social e produtiva, ocorrências que afetam também as cidades e o conjunto da sociedade.

Este contexto é reforçado pelas históricas alianças entre os setores do agronegócio, da mineração e da exploração florestal com o capital financeiro, as empresas transnacionais, os meios de comunicação, e as representações do Estado que impulsionam a privatização e o controle sobre as terras, águas, florestas e sementes. 

Uma das expressões desta aliança se dá pelo apoio financeiro, político e institucional à criação de grandes projetos que se destinam à produção de commodities ou para instalação de infraestrutura, que não consideram os impactos obre as populações locais e o meio ambiente.

Outra estratégia de articulação entre o Estado e o agronegócio se dá, também, na tentativa de isolar, enfraquecer e desacreditar os movimentos sociais perante a sociedade, criminalizando as lutas, as organizações e as lideranças. Para tanto, se utilizam de diversos mecanismos de repressão e intimidação, além da promoção de campanhas na mídia, visando influenciar negativamente, a opinião da população sobre a reforma agrária.

Destaca-se, ainda, que a lógica produtivista do agronegócio impacta profundamente na produção de alimentos, especialmente porque a cada ano se ampliam as áreas plantadas com as principais monoculturas para exportação, enquanto se reduz, drasticamente, o plantio das culturas básicas do cardápio da população brasileira, como o feijão, arroz e mandioca. A diminuição destas áreas deixa a produção de alimentos totalmente suscetível ao mercado externo e vulnerável às mudanças climáticas.

Segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento-CONAB, na safra 2015-2016, enquanto a produção de soja, que é o produto mais evidente do agronegócio brasileiro, ocupou em torno de 33 milhões de hectares, que corresponde a mais de 49 % da área plantada em grãos no país, a produção de feijão não chegou aos 3 milhões de hectares e a de arroz foi inferior a 2 milhões de hectares. Na mesma linha, a área plantada com cana-de-açúcar ocupou mais de 9 milhões hectares e a de milho 15 milhões de hectares. Este fato se reflete no desabastecimento, no descontrole dos preços dos produtos alimentares e no aumento da inflação.

Mais grave é que, ao mesmo tempo em que o agronegócio se fortalece e se aprofundam os processos de concentração e privatização das terras e dos bens da natureza, ocorre uma redução drástica da intervenção do estado na realização das ações de reforma agrária, na demarcação de terras indígenas, reconhecimento de territórios quilombolas, regularização de pequenas posses e na criação de Unidades de Conservação. Nos últimos 10 anos a média de famílias assentadas caiu de mais de 76 mil, para 25 mil famílias/ano e, no ano de 2016 apenas 2.016 famílias foram assentadas, segundo os dados do Incra.

Uma medida positiva é que, para apoiar o desenvolvimento dos projetos de assentamento, nos últimos anos foram implantadas algumas políticas públicas importantes que, mesmo insuficientes, contribuíram para a melhoria das condições de vida, trabalho e renda das famílias assentadas, destacando-se, dentre outras, o Programa de Aquisição de Alimentos-PAA e o Programa Minha Casa Minha Vida Rural.

No entanto, a partir do golpe parlamentar que conduziu Michel Temer ao poder vem ocorrendo a paralisação da maioria das ações, com sérios retrocessos nos direitos e conquistas constitucionais e o desmonte das políticas públicas e das estruturas de Estado voltadas à reforma agrária e ao desenvolvimento rural sustentável.

Este cenário impõe ao movimento sindical e demais movimentos sociais a ampliação e o fortalecimento das lutas pela terra que, mesmo sendo permanentes, ainda não conseguiram construir um ambiente de mobilização social capaz de alterar os rumos do modelo dominante de desenvolvimento rural.

Neste contexto, é essencial compreender que as disputas pela posse da terra e pelo modelo de produção, não dependem apenas de questões locais e, muito menos, dos esforços isolados dos agricultores e agricultoras familiares preocupados em concorrer num mercado totalmente dominado pelo agronegócio e pelas grandes empresas.

Para que a agricultura familiar e camponesa assumam papel estratégico para o futuro da humanidade é necessário que, além de ampliar as políticas públicas para o seu fortalecimento, sejam garantidas políticas de reforma agrária que ampliem os direitos de acesso e de permanência na terra para as populações sem terra e para todos os povos do campo e da floresta. O direito à terra e ao território são direitos básicos para a existência,  ampliação e o fortalecimento da agricultura familiar e camponesa.

Na perspectiva de transformar estas áreas em territórios que se contraponham à lógica destrutiva e excludente do agronegócio, é imprescindível, ainda, avançar na compreensão pela sociedade e os governos sobre o papel prioritário que deve ser assumido pelos assentamentos e pela agricultura familiar, que é o de assegurar a produção de alimentos saudáveis e a preservação da biodiversidade.

Neste contexto, é fundamental que o debate e as articulações sobre a GOVERNANÇA DA TERRA identifiquem, fomentem e fortaleçam as iniciativas organizacionais e assegurem a implantação de políticas públicas que promovam a democratização do direito à terra, priorizem a agroecologia e garantam condições de trabalho, renda, produção, comércio e qualidade de vida para os povos do campo, da floresta e das águas.

 

Nicinha Porto – Assessora de Reforma Agrária da CONTAG

Brasília, 12 de maio de 2.017

 


A segurança alimentar e a erradicação da fome estão, na maioria dos casos, diretamente relacionadas com o acesso à terra e outros recursos naturais e, portanto, à eficiência dos modelos específicos de governança da terra adotados em determinado território. O reconhecimento dessa relação e a sua universalização é materializado nas Diretrizes Voluntárias de Governança Responsável de Terras, Pescas e Recursos Florestais no contexto da Segurança Alimentar Nacional (VGGT), aprovadas pelo Comité Mundial de Segurança Alimentar (CFS) em Sessão Especial em Maio de 2012.


 



Alguns princípios-chave


Princípio 1: Plataformas multi-atores inclusivas.


Princípio 2: Reconhecimento dos direitos consuetudinários e da posse informal.


Princípio 3: Igualdade de género.


Princípio 4: Proteção contra a apropriação de terras.


Princípio 5: Administração efetiva de terras.


Princípio 6: Mecanismos de resolução de conflitos.

 


A implementação e a adoção efetiva desses princípios exigem, como mencionado no documento, que "todas as partes, incluindo as organizações da sociedade civil e o setor privado, sejam encorajadas a usar esforços colaborativos para promover e implementar essas Diretrizes de acordo com as prioridades e contextos nacionais. Todas as partes são encorajadas a divulgar informações sobre a governança responsável de posse da terra, a fim de melhorar as práticas. “(FAO / CFS, Parte 7, 26.5, p.44, Roma, 2012).


Esta perspetiva foi reforçada na 43ª Sessão do CFS realizada em Roma de 17 a 21 de outubro de 2016. Entre outras decisões e recomendações relevantes, o CFS 43 aprovou os Termos de Referência para compartilhar experiências e boas práticas na aplicação das decisões e recomendações do CFS  (em inglês). Na primeira sessão temática global sobre o acompanhamento da implementação das VGGT foram apresentadas e discutidas Experiências e boas práticas na utilização e aplicação das orientações voluntárias sobre a governação responsável da posse de terras, pescas e florestas no contexto da segurança alimentar nacional (VGGT) [1] (em inglês), estabelecendo um caminho para a adoção geral e efetiva promulgação das VGGT, seguindo cinco áreas complementares de intervenção:


Desenvolvimento de plataformas multi-atores: Focada no estabelecimento de plataformas permanentes institucionalizadas, que são vistas como um meio de garantir a efetiva implementação das VGGT.

Sensibilização: Focada na sensibilização de uma vasta gama de partes interessadas nas VGGT e em questões de governação da posse da terra, especialmente a sociedade civil e os governos.

Desenvolvimento de capacidades: Focada no reforço da capacidade das partes interessadas em implementar as VGGT. Fortemente ligada à sensibilização e dirigida a uma vasta gama de partes interessadas, particularmente a sociedade civil, líderes de comunidades e governos afetados por questões relacionadas com a posse de terra.

Operacionalização das VGGT: Focada na implementação, promovendo o uso prático das VGGT e ajudando as comunidades a garantir os direitos à terra.

Reforma dos quadros jurídicos e políticos: Centrada na integração das VGGT nos quadros políticos e jurídicos nacionais.ESAN-CPLP). Esta estratégia centra-se na melhoria dos sistemas de governação em matéria de segurança alimentar e nutricional a vários níveis e com vários intervenientes (nacionais / regionais); em prestar apoio imediato e sustentável às populações vulneráveis (proteção social); em promover o desenvolvimento de modelos sustentáveis de produção de alimentos, com processos de processamento e distribuição implementados pelos agricultores familiares.


A estrutura de governação multinível e multiatores definida para coordenar a implementação da estratégia, baseia-se no Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional da CPLP. O CONSAN é uma plataforma regional multiatores de diálogo ministerial e convergência a nível ministerial. Esta plataforma regional orienta a implementação da Estratégia de Segurança Alimentar e Nutricional (ESAN) e está ligada aos Conselhos Nacionais de Segurança Alimentar e Nutricional ou a Plataformas multiatores equivalente de cada Estado membro da CPLP. No seu contexto, foram criados grupos de trabalho temáticos específicos a nível regional ou nacional, a fim de elaborar propostas concretas de políticas e programas a aprovar pelos Conselhos regionais e nacionais, nomeadamente o Grupo de Trabalho da Agricultura Familiar [2], que detém um papel central nas questões de Governança da Terra.


O Pacto para a Melhoria da Governança da Terra na CPLP[3]


Em Setembro de 2016, no âmbito do FAFSAN II - CPLP (II Fórum sobre Agricultura Familiar e Segurança Alimentar e Nutricional na Comunidade de Países de Língua Portuguesa) em Lisboa, o Mecanismo de Facilitação da Participação da Sociedade Civil no CONSAN-CPLP (MSC-CONSAN) convidou outras partes interessadas (Universidades, Parlamentares, Setor privado, Embaixadores e representantes da Presidência do CONSAN) para discutir alternativas no sentido de melhorar a governança da terra nos países membros da CPLP. Após uma frutuosa discussão, foi acordado estabelecer um Pacto para implementar as VGGT e melhorar a Governança da Terra. Para orientar a sua execução, deverão ser implementados os seguintes processos:


1- Produção de Relatórios Nacionais de Governança da Terra pelo Secretariado Nacional do Conselho do Segurança Alimentar e Nutricional e organizações congéneres de cada país; Os relatório serão baseados nas contribuições fornecidas por todas as partes interessadas relevantes e deverá ser discutido e aprovado anualmente numa reunião específica do Conselho. Em países onde ainda se encontrem em implementação os Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, outros mecanismos de intervenientes múltiplos deverão ser utilizados, como em Moçambique, onde existe o Fórum de Consulta sobre Terras, ou em Angola, onde o governo se encontra a instalar um mecanismo para este fim envolvendo todas as partes abrangidas pela Agricultura familiar.


2- Os Relatórios Nacionais serão enviados ao CONSAN - CPLP, permitindo que o seu secretariado produza um Relatório Regional que será discutido e aprovado a nível regional.


3- O Relatório Regional será partilhado com outros países membros do CFS durante uma componente específica da agenda das sessões do CFS.


Espera-se que a elaboração deste relatório seja um processo que mobilize todas as partes interessadas. Por conseguinte, devem ser promovidas atividades de sensibilização e de reforço das capacidades. Simultaneamente, é necessário melhorar os conjuntos de dados sobre terra a fim de apoiar a recolha e utilização de dados.


É de realçar que a FAO reconhece a importância desta abordagem para a operacionalização eficaz das VGGT no caminho da Agenda de 2030 para a consecução dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.


 



Diretrizes para o Apoio à Agricultura Familiar nos Estados-Membros da CPLP


[Parte 3. Acesso à terra, ponto 3.1]


“os Estados-Membros, em colaboração com outros atores relevantes, devem prioritariamente aplicar de forma progressiva as Diretrizes Voluntárias para a Governança Responsável da Terra, dos Recursos Pesqueiros e Florestais no contexto da Segurança Alimentar Nacional e elaborar relatórios de acompanhamento nacionais, no âmbito dos Conselhos Nacionais de Segurança Alimentar e Nutricional.”


Versão 2.0, p. [10], em revisão, 2016

 


Objetivos do Pacto e resultados a alcançar


O objetivo geral do Pacto consiste na implementação das Diretrizes e melhorar a Governança da Terra nos países membros da CPLP. Isto será conseguido através do desenvolvimento de sistemas inclusivos de dados abrangentes relacionados com a terra e pelo desenvolvimento de um quadro de monitorização para as Diretrizes. Para que isso aconteça, os membros dos Conselhos Nacionais e o Grupo de Trabalho da Agricultura Familiar têm de ser qualificados para desenvolver sua capacidade de vincular fontes multilaterais de dados, informações e documentos e avaliar e relatar a implementação das Diretrizes.


A disponibilidade de dados, informações e documentação de qualidade é uma função-chave que será fornecida pelos conjuntos de dados existentes sobre governança de terras, alojados em portais como o Land Portal, e outros. A implementação do Pacto também melhorará a avaliação da aplicação das Diretrizes a partir de dados descentralizados, envolvendo todas as partes interessadas, incluindo as mais vulneráveis, eventualmente recolhidas com uma www.app e seguindo uma metodologia participativa para estruturar relatórios locais, nacionais e regionais, devendo levar em conta os trabalhos sobre recolha de dados de avaliação descentralizada das VGGT já realizados, por exemplo, pela ActionAid e pela FIAN International.


Isso permitirá que as partes interessadas discutam e fortaleçam a convergência de políticas para reformar os quadros jurídicos e de políticas de recursos naturais existentes nos países membros da CPLP, melhorando assim a Governança global de terras na CPLP.


A implementação do Pacto envolverá, principalmente, os participantes do Grupo de Trabalho da Agricultura Familiar (GT AF-CONSAN / CPLP) [4] do CONSAN, bem como de outros atores relevantes de diferentes categorias sociais (sociedade civil, setor privado, parlamentares, academia, governo e autoridades locais), que participam nos conselhos nacionais e regionais de segurança alimentar e nutricional, e estruturas equivalentes de governança fundiária nos países membros da CPLP.


A sistematização das informações geradas permitirá o estabelecimento formal de um Observatório de Governança da Terra na CPLP, bem como a eventual nomeação, por todos os atores relevantes, de um Relator / Provedor de Governança da Terra, garantindo assim a sustentabilidade geral do processo.


 


Conclusão


Em Setembro passado (2016) foi dado o primeiro passo para a construção e consolidação do Pacto para a melhoria da Governança da Terra na CPLP. Trata-se de um caminho longo, de que este debate faz parte integrante, que terá uma fase decisiva para o seu arranque institucional na II Reunião Extraordinária do CONSAN-CPLP, que decorrerá a Junho deste ano (2017) em Brasília.


Do debate aqui realizado podemos concluir que é necessário criar um sistema em que todos os eventos, fontes de informação e dados fidedignos sobre o uso e a administração atual da Terra na CPLP possam ser analisados, promovendo declarações e posicionamentos informados, e dando origem a Políticas e Legislação adequadas para o cumprimento das Diretrizes para o apoio à Agricultura Familiar nos Estados membros da CPLP, conforme aprovadas pelo CONSAN.


A sustentabilidade deste processo reside na consolidação e monitorização de acordos de política de Governança da Terra envolvendo a convergência dos países membros da CPLP com as políticas globais previstas, determinando que a CPLP e os seus Estados-Membros devem incluir este objetivo de Melhorar a Governança da Terra nos orçamentais regulares do Conselho Regional CONSAN-CPLP e dos Conselhos Nacionais e órgãos equivalentes. A eventual constituição de um Observatório de Governança da Terra e do repositório de informações obtido e acumulado poderá beneficiar do apoio de outras entidades intermediárias através das informações assim disponibilizadas. No entanto, este caminho em direção à plena autonomia na elaboração dos Relatórios de Governança da Terra na CPLP requer um esforço inicial de capacitação, bem como apoio organizacional.


 


Convergência global


 


A consolidação deste Pacto permitirá monitorar efetivamente a Governança da Terra e a adoção das VGGT na prática dos países membros da CPLP, evidenciando boas práticas na consolidação estrutural dos processos de convergência da política de segurança alimentar e nutricional em curso na CPLP com as políticas globais, incluindo a implementação de decisões e recomendações do CFS e da Agenda 2030 para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.


 


 

[1] In: CFS 2016/43/8, July 2016, p. 4-5; htOp://www.fao.org/3/a-mr218e.pdf


[2] “O Grupo de Trabalho de Agricultura Familiar do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CONSAN-CPLP), adiante GT AF, ressalta a contribuição fundamental da Agricultura Familiar para o desenvolvimento sustentável dos países da CPLP, onde cumpre um papel central na produção de alimentos seguros e saudáveis, no emprego agrícola, na geração de renda, na diversificação de culturas, na gestão da terra, água, florestas e outros recursos naturais e na protecção e promoção da agrobiodiversidade e de conhecimentos tradicionais associados. "; Em: DECLARAÇÃO DO GRUPO DE TRABALHO DE AGRICULTURA FAMILIAR DO CONSAN-CPLP | Brasília, DF - Brasil, 26-29 de Maio de 2014


[3] O Pacto para a Melhoria da Governança da Terra na CPLP é um processo de convergência de políticas em curso que liga a Sociedade Civil, o Sector Privado, a Academia, os Parlamentares e os Governos dos países membros da CPLP.


[4] GT AF-CONSAN/CPLP: Trata-se de um grupo multiatores "ad hoc", que reúne representantes da sociedade civil, universidades, setor privado, municípios, parlamentares e governos da CPLP, encarregados de desenvolver propostas concretas de políticas e programas a serem discutidas e aprovadas pela CONSAN-CPLP no domínio da agricultura familiar e do acesso aos recursos naturais. Os relatórios nacionais sobre governação fundiária e sobre a operacionalização das VGGT serão realizados por este grupo de trabalho.


As observações de Madi indicam um bom caminho para constituir um instrumento nacional de implementação e monitoramento das Diretrizes.

Um aspecto importante das Diretrizes, e que explica muito de seu conteúdo, é que ela foi elaborada e discutida no Comite de Segurança Alimentar Mundial (CSA) após sua reforma que criou novos procedimentos e mecanismos de participação. Dessa vez a participação da sociedade civil e do setor privado não se deu apenas nos momentos das consultras públicas como costuma acontecer nos foruns insternacionais. A participação se deu em todo o processo, inclusive, na negociação de todo o seu conteúdo o que deu legitimidade e força política para as Diretrizes, além de garantir avanços importantes em seu conteúdo.

A mesma participação tem que ser garantida agora, seja no ambito do CSA para definir o metodo de monitoramento, seja nos paises para organizar sua implementação. E as Diretrizes trazem recomendações claras sobre isso. Um dos principios para sua implementação é exatamento o da consulta e da participação, que orienta que se assegure "a participação ativa, livre, eficaz, significativa e informada de individuos e grupos nos processos correspondentes de tomadas de decisões". Outros princípios destacam a necessidade da transparência e da prestação de contas (Diretriz 3B, itens 6, 8 e 9).

Além disso, as Diretrizes orientam os Estados a "criar plataformas e marcos multissegmentados, em nível local, nacional e regional, ou utilizar os já existentes [como no caso o Consan], a fim de colaborar na execução (...) monitorar e avaliar a implementação". A participação deverá se dar em um processo "integrador, participativo, sensível às questões de gênero" e para isso os Estados podem solicitar apoio técnico a órgãos regionais e internacionais" (Diretriz 26.2).

A participação nessa plataforma que, em geral, conta com a presença de órgãos do Estado e diferentes setores da sociedade não é incompatível com a criação de espaços próprios da sociedade civil. Nestes espaços, a sociedade civil pode desenvolver iniciativas autonomas de difusão e monitoramento das Diretrizes e preparar sua atuação na plataforma multiatores nacional.

As experiências da Plataforma Camponesa e da REDSAN na CPLP mostram claramente como pode se combinar de forma virtuosa o funcionamento de espaços próprios de organização e discussão com a participação nos fóruns gerais da comunidade.

 

Uma das primeiras experiências de monitoramento regional das Diretrizes está em curso na Reunião Especializada sobre Agricultura Familiar do MERCOSUL (bloco de países da América do Sul formado pelos paises membros Argentina, Paraguai, Uruguai, Brasil e Venezuela, além do Chile, Equador e Bolívia como associados). Participam da REAF representantes de governos e da sociedade civil e ela se organiza por grupos temáticos; um deles trata do tema da terra. A REAF organizou a consulta regional das Diretrizes na América do Sul a pedido do Comite de Segurança Alimentar Mundial e estimulou os paises que dela participam a apresentar contribuições ao documento. Depois da aprovação das Diretrizes, a REAF impulsionou iniciativas de difusão e de intercambio entre os paises e iniciou um processo de monitoramento regional da aplicação das Diretrizes nos paises do MERCOSUL. O primeiro passo foi a elaobração de informes nacionais que foram compilados em um primeiro informe regional que foi, recentmente, submetido às instâncias superiores do MERCOSUL. A intenção não é fazer uma comparação entre os países, mas valorizar e analisar o que vem sendo feito em cada país à luz dos princípios e dos dispostivos das Diretrizes. A apresentação dos informes nacionais no espaço regional permite uma socialização das realidades e o compartilhamento dos desafios e de iniciativas bem sucedidas, e, ainda, organizar ações de cooperação bilateral, de intercambio, incluindo atividades com a sociedade civil e gestores governamentais.

Nessa experiência as Diretrizes tem sido tratadas como uma ferramenta para garantir os direitos das comunidades rurais à terra, melhorando o marco legal e as ações do Estado, como parte do grande desafio de garantir a segurança alimentar e o desenvolvimento sustantável.

Maria Emília Lisboa Pacheco. Assessora da Organização Não Governamental FASE-Solidariedade e Educação. Participante do Forum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional e da Articulação Nacional de Agroecologia. Ex-presidenta do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional

Saudamos a iniciativa deste debate.  Concordamos com os comentários de Caio França que nos diz que “o Relatório Base, que indicava a situação do país (Brasil) tendo por base o ano de aprovação das DVGT e que deveria ter sido internalizado pelo INCRA e demais áreas do MDA, não foi apresentado e discutido nas instâncias e mecanismos de participação social dos conselhos de políticas públicas relacionados às DVGT, em especial, o CONSEA e o CONDRAF”.

Mas podemos também afirmar que no Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, ao debatermos a questão do acesso à terra e direitos territoriais e sua relação com o Direito Humano à Alimentação, nos remetemos às DVGT. Consideramos a indivisibilidade do Direito à Alimentação e do Direito à Terra e ao Território, uma vez que os modos de organização, os sistemas tradicionais de apropriação e uso da terra, e as culturas alimentares dos povos indígenas, camponeses e comunidades tradicionais estão estreitamente ligados aos modos de vida, não podendo ser tratados de forma dissociada.

Sem pretender alongar-me na história, é preciso dizer que, no Brasil, a questão da terra e dos direitos territoriais continua a se situar no centro do conflito social. Ela alimenta a profunda desigualdade e a tradicional relação entre propriedade, poder político e poder econômico.

A questão  agrária no Brasil é a história dominante da propriedade privada da terra. O  processo de concentração de terra, adquiriu vários formatos de concessões e favorecimento de grandes extensões de terras às classes dominantes desde a colonização. É a história do genocídio dos povos indígenas, da escravidão, e também  da imigração de agricultores da Europa e da Ásia. Quando foram libertados os escravos, no século XIX, a compra de terras firmou-se como instrumento jurídico de acesso à terra,  excluindo os pobres e ex-escravos (Lei de Terras de 1850).

As propostas de reformas de base no século XX, dentre as quais se incluía a Reforma Agrária, foram afastadas pelo golpe militar na década na década de 1960.

Não tivemos capítulos de mudança  estrutural em nossa história agrária. Não há registro de uma verdadeira Reforma Agrária, com reestruturação fundiária, embora tenhamos tido Planos de Reforma Agrária e o desenvolvimento de assentamentos agrários. Também   nunca houve sequer uma discriminatória de terras no país, para identificar as terras públicas. Os mecanismos fraudulentos de registro de terra por parte de supostos proprietários impulsionaram processos de expropriação do campesinato pelos atos que denominamos de grilagem e terras, sustentados de forma recorrente por atos de violência dos grandes proprietários contra os camponeses.

As lutas de resistência e proposições do campesinato, dos povos indígenas e comunidades tradicionais marcam a nossa história e são expressão de uma conflitualidade permanente na defesa da terra e do território, resultando, por exemplo,   em algumas conquistas plasmadas na Constituição Brasileira de 1988. 

Esta legislação expressou a formação pluriétnica do país, reconheceu o direito a diferença cultural e definiu como "direitos coletivos" o direito das populações ao seu território tradicional, a sociodiversidade, ao patrimônio cultural, ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e o direito à  biodiversidade.

Mas manteve-se  a segmentação da questão agrária e agrícola, favorecendo a visão da questão da distribuição da terra como questão de política social e não uma contraposição e questionamento ao modelo de desenvolvimento.   

Iniciamos e seguimos o século XXI com a  dívida histórica da democratização do acesso à terra aos camponeses e garantia dos territórios aos povos indígenas, comunidades quilombolas e demais comunidades tradicionais nos governos de perfil democrático-popular entre 2003 e 2016. Nesse período, a territorialização camponesa seguiu em ritmo menor do que a territorialização do agronegócio baseado no modelo agroexportador de commodities.  

O índice de Gini aumentou, mantendo a concentração fundiária. Entre 1998 e 2014, segundo dados da equipe do Prof. Bernardo Mançano da UNESP, na área das propriedades com mais de 100 mil hectares cresceu em 372%. As ações de desapropriação para assentamento dos camponeses foram praticamente paralizadas, especialmente a partir de 2012,  assim como a titulação de terras dos povos indígenas e de comunidades quilombolas. As Unidades de Conservação, sobretudo aquelas definidas de uso sustentável, a exemplo das Reservas Extrativistas, consideradas uma resposta adaptada à realidade do Bioma da Amazonia e modos de vida de suas comunidades tradicionais também não foram priorizadas.

Mas não podemos deixar de reconhecer a importancia de programas de fortalecimento da agricultura familiar, a partir de 2003, como modalidades de  crédito do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf); comercialização e segurança alimentar e nutricional no Programa de Aquisição de Alimentos – PAA e, Programa Nacional de Alimentação -PNAE, Programa de preço mínimo dos produtos da sociobiodiversidade - PGPMBio, Programa Bolsa Família,  Programa um milhão de cisternas ( P1Mc) e o Programa Uma terra duas águas ( P1+2) no Semiárido brasileiro.  Dentre as políticas que favorecem a agricultura  familiar e das comunidades tradicionais, elencamos a Política Nacional de Segurança Alimentar a Nutricional, a Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica e a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais.

Não há soberania e segurança alimentar e nutricional  sem a garantia do acesso à terra e aos direitos territoriais. Assim nos manifestamos insistentemente nos últimos anos no Conselho Nacional de Segurança Alimentar a Nutricional (Consea).  Esta visão conjuga, o direito à terra,  à água, e ao  livre uso da biodiversidade e sistemas de produção e consumos sustentáveis, baseados na agroecologia, como tem sido crescentemente defendido pelos movimentos sociais no Brasil.  

Com o golpe, a partir de 2016, o Consea manifestou-se contra  o processo de desmonte das políticas e violação dos direitos.  Foi elaborado um documento para debate sobre “Políticas Públicas de Segurança Alimentar e Nutricional – Análise de Conjuntura” – “Monitoramento da Sociedade Civil do Consea”, em novembro de 2016, uma análise a partir das diretrizes da Política de Segurança Alimentar e Nutricional. 

Registramos, dentre outras, críticas e denúncias:

  • A reestruturação do Poder Executivo com a extinção do Ministério de Desenvolvimento Agrário e do Ministério das Mulheres, Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos; o enfraquecimento do  Instituto Nacional de Colonização e  Reforma Agrária com a redução do seu orçamento;
  • Aprovação da drástica proposta de Emenda Constitucional (nº 95 de 15 de dezembro de 2016), que determinou que as despesas primárias, incluindo as que garantem os direitos sociais serão limitadas ao valor do exercício anterior e ficarão congeladas por 20 anos; 
  • Alteração no regramento de políticas e programas como o exemplo do Programa Bolsa Família e  Programa de Aquisição de Alimentos, que já vinha sofrendo restrições em algumas de suas modalidades no governo anterior, dificultando o acesso pela população;
  • Propostas de mudanças na legislação sobre titulação de lotes dos assentamentos da reforma agrária, com a finalidade de facilitar a arrecadação privada das terras. Hoje os títulos concedidos são inegociáveis. Alteração na legislação com adoção de  medidas para facilitar a estrangeirização das terras;
  • Recriação da Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar ações da Fundação Nacional do Indio (Funai) e do Incra na demarcação de terras indígenas e das comunidades quilombolas, que resultará em criminalização servidores, lideranças e deslegitimação dos direitos desses povos;
  • Execução de reintegrações de posse em favor de fazendeiros, sobretudo em terras tradicionalmente ocupadas como dos povos Guarani e Kaiowá;
  • Medidas que ameaçam o Direito Humano à Alimentação Saudável, com a flexibilização da lei dos agrotóxicos; alteração da rotulagem dos transgênicos, com a retirada do símbolo “T” nos produtos que contem até 1% de componentes transgênicos; aprovação de Lei de Acesso aos Recursos Genéticos sem a real garantia dos direitos dos povos e comunidades tradicionais; ameaça de aprovação de Lei de Cultivares que aumenta o monopólio sobre as sementes;
  • Proposta de mudança do Código da Mineração e simplificação do licenciamento ambiental para os grandes empreendimentos. No Brasil, o Estado tem domínio do subsolo, acima da lei de propriedade da terra, que está restrita ao solo. Mas hoje, entre as diversas propostas em debate no Congresso Nacional estão as que liberam a extração mineral em terras indígenas e há iniciativas de prospecção mineral em antigos assentamentos de Reforma Agrária, ameaçando a expulsão das famílias assentadas em programas governamentais. 

O CONSEA manifestou-se também contrário ao Projeto de Emenda Constitucional n° 215, de 28 de março de 2000, em tramitação no Congresso Nacional, que  estabelece como competência exclusiva do Congresso Nacional a aprovação da demarcação, titulação e homologação de terras indígenas, quilombolas e a criação de Áreas de Proteção Ambiental, ferindo assim o art. 231 e o art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal do Brasil. Também se manifestou por meio da Recomendação n° 001/2012 ao Supremo Tribunal Federal, solicitando que julgue improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n° 3.239 dirigida contra o Decreto n° 4.887, de 20 de novembro de 2003, que regulamenta o domínio das terras das comunidades quilombolas.  

 

Esses são exemplos, do quadro recessivo, que se dá em um cenário também de aumento da violência no campo. Em 2016, registraram-se 1.536 conflitos no campo, somando-se os conflitos por terra, água e conflitos trabalhistas, e um total de 61 assassinatos.    

O debate atual sobre a governança da Terra se dá em um momento da história do  aprofundamento do modelo hegemônico, baseado na chamada Revolução Verde, que se renova ampliando processos de acumulação capitalista e “despossessão”,  em um contexto de crises alimentar, climática, energética. A terra voltou ao centro da agenda com a crescente demanda pelos “4Fs”: food (alimentos), fiber (fibras ou ração), fuel ( combustíveis ou energia) e forest (florestas, madeira, celulose e carvão). Esse 4 Fs não abarcam ou  não explicam a demanda também por água e minérios, que também cresce no Brasil. Por isso entendo que a importancia da terra é renovada e ganha centralidade, mas coloca-nos questões que vão além de um problema agrícola ou agropecuário.

 

Mapear a expressão da questão agrária com suas várias dimensões nos países da CPLP é importante. Também considero a necessidade de aprofundarmos o sentido e alcance dos instrumentos internacionais que favoreçam a luta de resistência dos sujeitos de direitos que são os camponeses, povos e comunidades tradicionais que garantem o nosso alimento. Aqui se coloca, por exemplo, a importancia da Convenção 169 da OIT, que não apenas reforça instrumentos de redefinição da política agrária, mas também favorece a aplicação da política ambiental e de políticas étnicas, permitindo dialogar com a Convenção sobre Diversidade Biológica e o Tratado Internacional sobre os Recursos Fitogenéticos para a Alimentação e Agricultura (TIRFAA).

Prezados todos, Agradeço o convite para participar nessa interessante discussão, contando com anos de valiosas experiências em vários dos países CPLP no tema terra. Para entender minhas sugestões acho preciso lembrar as diretrizes que nortearam nosso trabalho primeiro no Brasil e Moçambique, depois na Angola, Guine Bissau e, de certa forma em Cabo Verde e São Tomé. O ponto número um sempre foi o seguinte: a FAO, em quanto agencia especializada das Nações Unidas, contando com as particularidades de ter acesso tanto aos governos como a um conjunto mais amplo de outros atores, organizados o menos, tem um dever histórico de empurrar pro-ativamente as discussões entorno ao tema da terra (no nosso caso), de maneira a colocar no debate argumentos e dados técnicos para ajudar as partes interessadas a centrar o debate não sob opiniões mas sob elementos fatuais e, no mesmo tempo, atuar como um facilitador de diálogo dentro de um mecanismo (que hoje em dia chamamos de mesa de negociação e concertação) que seja liderado pelos governos (e não pelos mercados) mas com uma presencia qualificada de outros representantes, elegidos pelas suas organizações, de maneira a trabalhar para conseguir produtos finais (sejam eles políticas, legislações, programas ou outras coisas) que tenham um sentido claro de “ownership” por parte deles. A centralidade dos governos hoje parece não ser questionada, mas é bom lembrar que quando nos começamos nosso trabalho de assessoria técnica, ainda a questão da centralidade dos mercados era muito forte e muito empurrada pelas agencias financeiras internacionais. Nosso Norte foi que os governos têm os direitos e a legitimidade para liderar esses processos, mas ao mesmo tempo eles tem um dever de abrir mão a mecanismos mas inclusivos e participados. O ponto de partida nosso foi o tema terra e as estruturas fundiárias porque tínhamos lido muito bem o livro “A Geografia da Fome” que o distinguido Josué de Castro escreveu em 1946. JdC foi depois presidente do Conselho da FAO, o seja um homem que não somente estudou o tema da fome, mas também trabalhou para empurrar uma ação mas decidida por parte da FAO. A hipóteses central do livro era a ligação muito forte existente entre as mãa distribuição das terras e a fome. Ele estudou primeiro esse tema no Nordeste do Brasil e, anos depois, fiz uma serie de analises em outras realidades mundiais. Esse para dizer que trabalhar para melhorar o programa da reforma agraria e para “inventar” o conceito político da agricultura familiar no Brasil (que desembocou no Pronaf), assim como os trabalhos em prol do reconhecimento dos direitos consuetudinários nos demais países CPLP, sempre foram, para nós, parte de uma estratégia mais amplia que era de trabalhar com vista ao tema segurança alimentar e desenvolvimento agrário. Não foi sempre fácil, porque a inercia interna de nossa organização faz que não ajuda a um pro-ativismo no campo, particularmente em temas como o de “terras” que tem dimensões políticas e de poder muito evidentes. Digo isto porque uma das áreas de trabalho útil e necessária para a mobilização entorno das VGGT passa pelo mesmo ativismo que nós fizemos no tema terra. A governança da terra é, no fim, um assunto de poder e da sua concentração com certos atores. Se o poder fosse distribuído de maneira mas igual, a governança da terra com certeza seria outra, e melhor. Historicamente todas as classes no poder, seja nos países do Norte como aqueles do Sur, montarão seu poderio político a partir do controle dos recursos naturais, terra em particular. Foram lutas para concentrar, mas poder e eliminar adversário. Hoje assistimos a mesma dinâmica. Temos “inventado” o tema da governança para dizer com palavras novas, um conceito antigo. Agora bem, historicamente que teve o poder nunca deixou-lhe facilmente. Isto é para dizer que sim uma força aleia ao sistema, que empurre (dentro de limites socialmente estabelecidos) para promover uma mudança, é muito difícil imaginar que o equilíbrio de poder possa mudar e a governança melhorar. Resumindo, uma política de alianças entre atores mais débil é seguramente útil e necessária, mas não é suficiente. E’ preciso ter alguém com um nível de aceitação mas grande, fazer esse trabalho de abrir portas e empurrar, democraticamente, os governos e demais setores poderosos, a abrir mão ao jogo democrático. Aguardo comentários, paolo groppo

As Diretrizes podem ajudar no tema dos investimentos em terras e projetos agropecuários, pois estabelecem as condições mínimas necessárias para isso, que incluem o respeito aos direitos das comunidades e uma sintonia com a promoção da segurança alimentar. Os Estados só devem apoiar estas iniciativas se elas forem coerentes com os "objetios de crescimento social e economico e com o desenvolvimento humano sustentável, centrando-se nos produtores de pequena escala"(Diretriz 12.3). Estes investimentos "devem proteger contra a expropriação dos detentores de direitos e da posse legítima e contra os danos ao meio ambiente, e também devem respeitar os direitos humanos"; "devem contribuir com objetivos de de políticas, como a erradicação da pobreza, a segurança alimentar e o uso sustentável da terra (...), o apoio às comunidades locais e o desenvolvimento rural, bem como garantir os sistemas locais de produção de alimentos (...) (D 12.4). Além disso, os "Estados devem oferecer garantias para proteger os legítimos direitos de posse, os direitos humanos, os meios de vida, a segurança alimentar e o meio ambiento dos riscos que possam derivar das transações em grande escala dos direitos de de posse da terra"(D. 12.6). As Diretrizes se apoiam em principios, entre os quais, o da consulta e da participação. Em função disso, a definição das regras para os investimentos e os projetos agropecuários devem contar com a participação das comunidades rurais (D. 12.8). Além disso,  os setores envolvidos tem o direito - e os Estados devem apoia-los - a fazer "avaliações independentes e prévias sobre os possíveis impactos, positivos ou negativos, que os investimentos possam ter sobre os direitos de posse, sobre a segurança alimentar e sobre a realização progressiva do direito humano à alimentação adequada (...)" (D. 12.10).

Outras diretrizes podem, igualmente, serem acionadas pelas comunidades, mostrando que suas demandas e suas preocupações estão ancoradas em referências internaconais assumidas por todos os países e que por isso devem ser respeitados e devidamente considerados.

 

O tema em discussão é um tema muito problemático, não só em São Tomé e Príncipe (STP), como em todos os países da CPLP.

Em 1991 (STP) cria-se a primeira lei de terra, na qual o usufruto era a figura jurídica de acesso/benefício para a sua posse, e há todo um processo regulamentar que se desenvolve a partir dessa lei para a distribuição de terras, das médias (50 Ha) e pequenas parcelas até 10 Ha. Foi um processo que se desenrolou com o apoio do Banco Mundial com as primeiras distribuições de terras, no qual a quantidade de terras a ser distribuída era proporcional ao número de familiares de produção (a lei determina que seja a família e não o indivíduo). Contudo, o processo foi sendo distorcido ao longo do tempo, quando a terra passou a ser troca de voto.

Havia uma governação, a Comissão Nacional Especial de Gestão de Terras, com múltiplos atores. A sociedade civil não estava nessa organização porque na altura não existia, não era organizada e não era interventiva. Era necessário que essa Comissão de Terras fosse reformulada e adaptada aos novos desafios. Um deles é não haver terras para os jovens e há todo um processo de desapropriação de terras distribuídas, quer por incultas quer por bem trabalhadas. Aqui começa outro processo mais perigoso: quando o subjetivo pode entrar na retirada de terras e na sua redistribuição e a quem. Este é o desafio atual.

Quem, como e quando. Somos avaliados para que a terra seja retirada ou seja dado algum tempo mais de forma a que possamos fazer os incentivos/ investimentos necessários, de forma a que possamos ter a documentação toda e estar novamente com a posse plena da terra.

Então, outro problema que existe é o cadastro que está feito. Há distribuição feita, há todo um conjunto de situações legais observadas, mas o cadastro não está feito. A instabilidade continua, e é necessário que se faça uma nova legislação na atribuição de critérios para a avaliação do nosso comportamento em relação à produção, e à terra recebida pelo Estado.

Cada país da CPLP tem os seus níveis referenciados na problemática da terra. O nosso não teve conflitos; foi mais pacífico. Torna-se necessário criarem diretrizes para que todos os países da CPLP possam cumpri-las, absorve-las, no seu pacote jurídico. No fundo, há troncos comuns e a governança da terra pode ser bem estabelecida. Este é um dos fatores que podemos desenvolver para a criação de um pacto na criação de um estereótipo organizacional, para podermos ter uma governação da terra com objetividade avaliativa.

As Diretrizes e o Direito Consuetudinário

Entre os temas importantes para quase todos os países da CPLP está o reconhecimento dos direitos de posse dos povos e comunidades com sistemas consuetudinários de posse e dos diretios de posse informais.

As Diretrizes fornecem referências importantes que poderão ser utilizadas pelas comunidades para garantir seus direitos. Além de reconhecer o direito consuetudinário e os sistemas tradicionais de posse, as Diretrizes destacam a importância dos Estados identificarem e protegerem “todos os direitos e titulares de direitos de posse existentes, registrados ou não” (Diretrizes 7.3 e 9.5); oferecerem “às pessoas pobres e vulneráveis plenas oportunidades de reconhecimento de seus direitos de posse” (7.2); e estabeleceram “salvaguardas para evitar a violação ou extinção de direitos legítimos de posse, inclusive daqueles que não estão amparados pela lei” (7.1).

Um destaque deve ser dado à percepção ampliada sobre os signifiados dos recursos naturais expressa pelo reconhecimento de que “a terra e os recursos pesqueiros e florestais encerram um valor social, cultura, espiritual, econômico e político para os povos indígenas e outras comunidades com sistemas tradicionais de posse” (Diretriz 9.1).

Apesar de reconhecer e valorizar o direito consuetudiário as Diretrizes trazem uma ressalva importante, coerente com os princípios de equidade e jusitiça e igualdade de gênero. Nos casos em que as reformas constitucionais ou jurídicas reforcem “os direitos das mulheres e as colocam em situação de conflito com os costumes, todas a partes devem cooperar para essas mudanças sejam incorporadas aos sistemas consuetudinários de posse” (Diretrizes 9.6).

 

A defesa dos direitos das comunidades rurais pode recorrer às Diretrizes e à outras obrigações assumidas pelos países no campo dos direitos humanos e, mais recentemente, do direito humano à alimentação adequada.

As Diretrizes estabelecem que “nas áreas onde a terra e os recursos pesqueiros e florestais são de posse ou controlados pelos Estados, estes devem determinar o uso e o controle desses recursos, à luz de objetivos sociais, econômicos e ambientais mais amplos” e que suas ações dem ser ajustar às obrigações decorrentes do direito nacional e internacional e de compromissos voluntários assumidos” (Diretriz 8.1.). Além disso, registra que a

propriedade e o controle estatal dos recursos naturais devem reconhecer, respeitar e promover os direitos legítimos de posse de indivíduos e comunidades, incluídas as que tenham sistemas tradicionais de posse (8.2.)

O equilíbrio social e o atendimento das necessidades básicas de, pelo menos, 60% da população em Moçambique estão aquém de ser atingidos, mesmo tratando-se de um país rico em recursos naturais. Este cenário compromete o enraizamento da sustentabilidade ambiental.

Portanto, sem sustentabilidade ambiental na operacionalização do desenvolvimento, será impossível alcançar a qualidade de vida desejada, hoje e futuramente. Por exemplo, o crescimento económico, a distribuição social equilibrada traduz-se, sem dúvida, num ambiente sustentável, na inserção de todos os intervenientes económicos nas boas práticas da cidadania e governação e na boa qualidade de vida para toda a nossa sociedade.

As necessidades de Desenvolvimento exigem um ambiente propício à expansão das actividades produtivas e à implantação de novos empreendimentos sociais, económicos, turísticos, entre outros. Por seu turno, é fundamental que as práticas de governação (na esfera pública e privada) incluam a componente da sustentabilidade ambiental.

Neste sentido, a boa governação da terra é o elemento primário na definição de um Estado e o recurso mais importante na edificação do mesmo Estado.

Sendo assim, os mecanismos da ocupação da terra são determinantes para o nível de satisfação dos seus utentes, pois é com base no acesso a esta terra que os seus titulares determinam os propósitos de sua ocupação.

Neste âmbito que, o processo de uso e aproveitamento da terra, em que as comunidades estabelecem várias relações com a terra, desde a geração de riqueza, a preservação de memórias sócio-culturais colectivas, bem como a manutenção de uma identidade local.

Analisando o processo de Governança da terra em Moçambique, traz para o centro das atenções os factores limitação técnica estrutural do sector público, má-governação, pode-se dizer que se trata de um problema amplamente generalizado nos diferentes quadrantes da sociedade, designadamente a nível dos sectores público, comunitário local, privado e da sociedade civil.

O fenómeno mostra a estreita relação com a problemática da pressão sobre a terra e outros recursos naturais que actualmente se vive no país.

O fenómeno de conflito de interesses em Moçambique revela-se as relações de mútua causalidade e efeito entre este e os factores limitação técnica estrutural, da má-governação. Como causa e efeito da falta de transparência na gestão e administração da terra e outros recursos naturais.

Verifica-se que existem relações entre o fenómeno de conflito de interesses por um lado e, por outro, a implementação da legislação e os processos de desenvolvimento económico do país conduzidos pelo Estado, pelas comunidades locais, pelos megaprojetos e pelas Organizações da Sociedade Civil.

O fenómeno de conflito de interesses surte um impacto negativo tanto da implementação da legislação, quanto no desenvolvimento económico do país.

A análise da legislação revela ainda que há uma clara incidência da normatividade sobre o sector público, não obstante a transversalidade do fenómeno de conflito de interesses pelos diferentes sectores.

O sector privado encontra-se igualmente preocupado com a problemática do conflito de interesses, procurando, por sua vez, criar e instituir regras que previnam o fenómeno, sobretudo na esfera das relações económicas entre os grandes interesses corporativos, de modo a minimizar a incidência de actos que constituam injustiça entre os diferentes actores.

Naturalmente, o presente status jurídico da problemática do conflito de interesses, caracterizado pela sua dispersão normativa, reduz a eficácia do seu controlo, combate e, sobretudo, da sua prevenção.

A situação espelha a dinâmica da importância cada vez maior que a questão do conflito de interesses vem suscitando a nível da sociedade moçambicana, revelando igualmente a necessidade da sua regulação específica para se dar resposta à necessidade de combate a corrupção, a falta de transparência e a má-governação, numa perspectiva de reforço das medidas de prevenção do fenómeno.

Dado o carácter invasivo do fenómeno de conflito de interesses, o seu combate deve ser realizado na perspectiva de um controle social abrangente envolvendo os vários sectores e instituições da sociedade e não simplesmente numa perspectiva estrita e exclusivamente jurídico-legal.

Olhando para a missão de uma organização como a ROSA, em que congrega varias acções ligadas a segurança alimentar e nutricional por parte dos seus membros, a proteção dos direitos das comunidades locais sobre a terra e outros recursos naturais e um pacote estratégico de acção.

Um exemplo concreto é a delimitação das terras das comunidades locais onde a pressão sobre os recursos naturais se mostra evidente, através de elaboração de planos de uso da terra desenhados de forma criativa, com base na legislação, de modo que a sua implementação não requeira recursos especiais, que não os próprios recursos costumeiros cuja ocupação constituiu a base para que lhes seja conferido DUAT.

A Resolução n◦ 70/2008, de 30 de Dezembro, que aprova os Procedimentos para a Apresentação e Apreciação de Propostas de Investimento Envolvendo Extensão de Terra Superior a 10.000 Hectares reforça o quadro jurídico que “regula” o estabelecimento de parcerias entre comunidades locais e Investidores privados.

Tais parcerias têm o potencial de reduzir em grande escala a incidência do fenómeno de conflito de interesses, na medida em que cria alternativas para acomodar de forma legítima os diferentes interesses em jogo.

O olhar da terra como seguro social, e o mecanismo de cedência ou empréstimo da terra sem envolvimento das lideranças locais assim como membros da família, tem sido apontado como principais factores de conflito de terra entre as comunidades. Assim, sugere-se uma maior divulgação dos mecanismos/condições formais de acesso e posse de terra pelas comunidades, previstos na Lei de Terra (97);

O estágio actual de governação da terra em Moçambique ainda não é satisfatório e precisa de ser melhorado. As populações no campo ou nas zonas rurais em Moçambique ainda sofrem usurpações de suas terras, principalmente, por falta de conhecimento e informação sobre os seus direitos relativamente ao Uso e Aproveitamento de suas terras.

O Estado Moçambicano através do seu Governo deve reforçar ainda mais, a informação junto às populações rurais através dos meios de comunicação social e outros sobre as matérias de direito e aproveitamento de terra. As organizações não governamentais também podem e devem ajudar o governo no trabalho de sensibilização, educação e formação das comunidades sobre os seus direitos e deveres no uso e aproveitamento de terra.

Até hoje, obtivémos 18 respostas ao questionário sobre O Pacto para a Melhoria da Governança da Terra na CPLP, oriundas do Brasil (1), Cabo Verde (4), Guiné-Bissau (2), Moçambique (2), Portugal (8), e São Tomé e Príncipe (1)

Setor de actividade por país de residência

O setor de actividade mais representado foi o da Agricultura Familiar (9), mas a Sociedade civil (8), a Academia (6) e o Setor Privado (3) também se fizeram representar, cobrindo um vasto leque de actividades directa ou indiretamente relacionadas com a Governança da Terra para a segurança alimentar e nutricional.

Meio mais adequado para a divulgação das VGGT

Este painel, que por diversas razões optou por participar neste debate através do questionário, entende que o meio mais adequado para a divulgação das VGGT consiste na Comunicação social, imprensa, jornais, rádio e televisão (14), logo seguida pela realização de Sessões de divulgação e mobilização presenciais (13) e pela presença do tema na internet através de um website (10).

Cartografia prioritária

Quanto à necessidade de proceder ao monitoramento de terras, recursos, usos, conflitos e extremas, através do seu mapeamento, verificamos que deve ser dada a maior prioridade ao Mapeamento de Conflitos no Brasil (max=3), em Moçambique (3), Cabo Verde (2,75), Portugal (2,75) e Guiné Bissau (2,5); seguido pelo Mapeamento de Terras em Portugal e na Guiné Bissau (max=3), e em Cabo Verde (2,75).  

O Mapeamento de recursos surge em 3º lugar, sendo no entanto de prioridade máxima na Guiné Bissau (max=3) e em Moçambique (2,5), enquanto o Mapeamento de Usos se revela muito prioritário em Moçambique (2,5).

A Demarcação de extremas, fixando os limites de propriedade fundiária, é de extrema prioridade em Moçambique (max=3) e em Cabo Verde (2,5).

Monitoramento Cartográfico Brasil Cabo Verde Guiné Bissau Moçambique Portugal São Tomé e Príncipe Prioridade (média)
Mapeamento de conflitos 3 2,75 2,5 3 2,75 2 2,6
Mapeamento de terras 2 2,75 3 2,5 3 1 2,4
Mapeamento de recursos 1 2,25 3 2,5 2,25 2 2,2
Mapeamento de usos 2 2,25 2 2,5 2,125 2 2,2
Demarcação de extremas 1 2,5 1,5 3 1,875 1 1,8

 

Aguardamos mais comentários a fim de enriquecer o debate e consolidar a melhor visão para uma Governança da Terra na CPLP efectiva, em benefício da Segurança Alimentar e Nutricional das suas populações.

 

O estagio actual de Governação de terra em Moçambique,  não  é satisfatório. Assiste se o espectáculo em quase todo o território nacional sobre a gestão de terras.

Fala se que a terra e do Estado, não se vende, não se penhora e nem se aliena. Na prática o que vivemos ou seja, assistimos o inverso, ora vejamos:

Ao nível dos Régulos ou Lideres Comunitários que deviam representar e defender os interesses do Estado ou do Governo, porá e simplesmente, combinam com aqueles que se interessam em comprar parcelas de terras e, eles vendem sem consultar os nativos das mesmas zonas. Quando aparecer alguém interessado em cortar madeira ou troncos , os Régulos ou Lideres Comunitários, Vendem  e eles exploram e desmatam sem deixar arvores para defender a zona explorada.

Os Chefias:  nos níveis dos Postos , Distritos e províncias directa ou indirectamente, desfazem usando o poder que cada um tem.

Quando deslocamos para zonas fronteiriças com os Países vizinhos (Zimbabwe, Zâmbia ou Malawi), notamos uma grande diferença, nota se como se Moçambique fosse um Pais sem donos. Um Pais abandonado. Pois não se justiça que quando proclamamos a doce independência, encontramos quase um pouco de tudo que podíamos muito e bem aproveitar.

Os desenvolvimentos que almejamos para o nosso Pais esta ultrapassar limitem. Quando falamos em coro desenvolvimento, significa destruir? Moçambique daqui a três ou quatro anos, não haverá arvores para sombra e nem para proteger ou defender qualquer situação calamitosa que possa acontecer! A vulnerabilidade e já generalizada!

Poderia ser travado ou seja, traçar estratégias para estancar esta Honda de criminalidade contra a terra. Mas, o cenário começa com os Governantes. Quem pode isso travar?!... A voz do povo já não e ouvida porque não se consulta em nada!

O Governo pode de alguma forma, no da sua governação, traçar medidas que visam melhorar o Pais e o seu povo. Mas o que assistimos. Não se justifica que este povo merece algo de respeito (consultas).

Os Garimpeiros fazem e desfazem a luz do dia, criando problemas com as aguas dos rios vizinhos, criando a poluição severa a ponto de os peixes não conseguirem viver. Isto não é para o moçambicano perguntar se deslocar para Distritos de Manica, Barué, Mossurize e outros cantos deste Pais. Refiro dos Rios Revué, Pungué, Missica, Russapa , Búzi e outros espalhados por vasto Moçambique. As águas destes rios não servem para mais nada!

A pergunta que se faz é: O que os governantes querem com este Pais?  Desfazem parecem estrangeiros porque?

Em quase todos Municípios o grito é o mesmo. Usurpação de terras aos cidadãos nativos.

Devia se concentrar todo esforço possível para traçar uma linha estratégica para que o Pais possa ter politica para produção agrícola o suficiente com vista a desnutrição crónica acentuada, enquanto temos terras produtivas desde sector familiar ate aos empresariados. Havia zona consideradas celeiros de Moçambique, produziam citrinos para exportação e abasteciam quase todo o Pais. Hoje tornaram desérticos em citrinos.

SUGESTOES:

Que o Governo procure foras ou estratégias para a terra sirva os interessem do povo, criando incentivos aos agricultores para garantir SAN.

Que a REDE SAN-CPLP, durante o  evento ora a realizar, estude melhor forma para que Moçambique na qualidade de membro da REDE, encontre mecanismos internos ou externo, para  mudar suas politicas agrárias e uso e aproveitamento de terras.

A REDE SAN _ CPLP proponha de acordo com as experiencias dos outros Países membros, soluções para que Moçambique não continue a desmatar  as suas florestas ou seja os seus recursos naturais.

Que haja politicas agrárias que  para valorizem  o camponês que produz para alimentos com enxada de cabo curto para outra técnicas sustentáveis, para assegurar a SAN.

Propor medidas apropriadas para estancar a poluição nos rios circunvizinhos aos garimpeiros.

Bem haja REDE SAN_CPLP

Chimoio, aos 26 de Abril de 2017

Morais

A questão da governança da terra às vezes está ligada de facto a questões meramente políticas, da vontade política. Acredito que em alguns países temos boas ferramentas de gestão e governança, mas ao mesmo tempo essas boas ferramentas estão além da sua implementação. Isto é, costumo dizer, isto é uma demonstração de piscar para a direita e depois virar para a esquerda. Esse é o sinal que caracteriza a ligação entre a implementação das políticas públicas viradas para a gestão e governança da terra em relação àquilo que é a prática. Há um esvaziamento muito grande e é um desafio que se tem que tomar em conta seriamente dentro da CPLP se de facto queremos que a Estratégia da Segurança Alimentar possa ser alcançada.

A outra questão que constitui um grande calcanhar de Aquiles que é preciso tomar em conta é que dentro dos processos da corrida massiva para África, a procura do recurso terra em alguns casos (as empresas, ou as multinacionais) são concedidas a alguns espaços. Mas ao mesmo tempo cria-se um outro cenário: até que ponto as responsabilidades que são assumidas do ponto de vista da compensação, do trespasse são tomadas em conta durante o período da implementação? Desde que se instalam, até que ponto cumprem com esses acordos que são formados?

No caso de Moçambique, infelizmente, a maioria dos acordos são feitos de forma verbal, não escrita, e isto não tem base para seguimento desse mesmo acordo. Se estamos a falar, por exemplo, na parte de produção de eucaliptos, é um emprego que vale por 2 ou 3 meses, no máximo 4 meses enquanto as mudas vierem a ser plantadas. No momento em que a muda se consegue desenvolver por si só, esse emprego de ponto de vista económico não é viável e então há que despedir essas pessoas. A pergunta que fica é: quando as pessoas voltam, voltam para onde? O que é feito dessa terra que entregaram para a monocultura?

Aqui há um problema no que diz respeito a relação entre o modelo de desenvolvimento e a perspetiva de crescimento e desenvolvimento das pessoas que pretendemos como país. Há que aliar essas duas questões.

A outra questão é como é que depois se gerem estes conflitos. Quais os mecanismos que existem dentro dos países para gerir esses conflitos? Num estudo que realizámos sobre a exploração da Green Resources (que faz uma exploração de grandes áreas no que é relativo a florestas em Moçambique), traz claramente que em algum momento parece que não há quem entre a mediar essa questão da violação clara da legislação. Há boas ferramentas, mas ao mesmo tempo essas ferramentas não são aplicadas e são violadas, e quando são violadas é nesse momento que começam a aparecer conflitos. Quem é que assume o papel de mediador se, de facto, a nossa perspetiva é ver se os nossos países se podem tornar autossuficientes no ponto de vista de produção de alimentos?

A pergunta que também fica é como é que estamos a proteger a agricultura familiar, que é essa que alimenta as pessoas, que vai dar uma mais-valia dentro do desenvolvimento humano? Em Moçambique e em muitos outros países costuma-se dizer que a cara da segurança alimentar é a mulher. A cara do desenvolvimento social, económico e humano é a mulher. A produtora de desenvolvimento é a mulher. Mas, ao mesmo tempo quando fazemos o retorno dessa mulher do ponto de vista de acesso e controlo desses recursos que permite fazer essa intercalação de sectores, ela já não entra no papel ativo. Há aqui uma visão que temos de tomar mais visível no que diz respeito ao empoderamento da mulher e ao trabalho que damos à mulher dentro desse processo para que ela possa desempenhar esse papel que estamos, em todas as plataformas, a dar.

Eu acho que este pacto é uma mais valia do ponto de vista de garantir a transparência para podermos definir quais são os nós de tratamento comuns que podem ser tomados em conta dentro da promoção da Estratégia de Segurança Alimentar. O pacto é fundamental para dinamizar esta estratégia ao nível da própria CPLP.

As questões fundiárias constituem um elemento central das políticas agrícolas, de desenvolvimento rural e do ordenamento urbano. As políticas fundiárias ocupam um lugar central nas políticas de desenvolvimento, de luta contra a pobreza e das desigualdades, assegurando, em particular, a segurança da posse da terra e outros recursos naturais.

Tal como podem contribuir para a prevenção dos conflitos, podem também provocá-los, caso as condições de acesso à terra provoquem, no meio rural ou no meio urbano, desigualdades intensas e insegurança. Por outro lado ao incentivar o investimento, elas podem também contribuir para a confiança e para o crescimento económico.

A forma como uma sociedade define e implementa os direitos de propriedade sobre a terra e sobre os recursos naturais revela muito sobre a mesma. Isto é tanto mais importante quanto sabemos que as relações que se estabelecem em torno do fundiário são eminentemente conflitivas. Por essa razão é importante contar com a participação de todos os atores relevantes na governança fundiária. Não há outro caminho para um desenvolvimento sustentável de nossos países.

Os Países membros da CPLP possuem realidades distintas nesta área mas também partilham aspectos cada vez mais comuns, como sejam, a crescente pressão sobre a terra e os recursos naturais, a degradação de terras, dificuldades para implementação da legislação existente e (ou) a ausência de regulamentação da mesma, cadastros incompletos e desactualizados, zoneamentos agro-ecológicos pouco adequados, falta de meios técnicos, equipamentos, entre outros. Além dos problemas atrás mencionados partilham também uma história recente de sucessos seja no desenvolvimento de instrumentos normativos e leis de terra formuladas de forma participativa seja, por exemplo, na sua efectivação através de demarcações participativas e/ou entrega de títulos a comunidades tradicionais, mulheres e jovens agricultores. Esta dinâmica envolve todos os países sejam eles do Sul ou do Norte como é o caso de Portugal onde uma ampla reforma florestal está em curso ou um banco de terras está em implementação.

Importa assim dar continuidade às discussões já iniciadas ao nível dos países da CPLP para construir um Pacto entre os atores relevantes representados no CONSAN – CPLP. Tal acordo e sua implementação poderão constituir um exemplo único para operacionalização das Diretrizes Voluntárias para a Governança Responsável da Terra, dos Recursos Pesqueiros e Florestais no contexto da Segurança Alimentar Nacional (DVGT) aprovadas na 38ª Sessão extraordinária do Comité Mundial de Segurança Alimentar (CSA), em Maio de 2012. 

Estão de parabéns todos os actores representados no CONSAN – CPLP pelo consenso já obtido quanto à importância deste Pacto. Está particularmente de parabéns o Mecanismo de Facilitação da Participação da Sociedade Civil por lançar esta discussão que certamente permitirá avançar neste caminho.

 

Francisco Bendrao Sarmento

Chefe do Escritório da FAO junto de Portugal e da CPLP 

Olá a todos e todas!

 

O acesso equitativo à terra e a outros recursos naturais é fundamental para a segurança alimentar e nutricional e para um padrão de desenvolvimento inclusivo em nossos países.

Os desafios são imensos e para enfrentá-los nada melhor do que poder contar com um espaço de diálogo e de intercâmbio de experiências e de boas prática, aberto a participação de todos os setores.

Para alcançarmos uma melhor governança da terra nos países da CPLP podemos contar com um importante ferramenta, as Diretrizes Voluntárias sobre a Governança Responsável da Terra, dos Recursos Pesqueiros e florestais no contexto da segurança alimentar nacional.

As Diretrizes foram aprovadas por consenso por 192 países e já estão sendo utilizada como referência por comunidades locais, governos nacionais e movimentos e organizações da sociedade civil para analisar a governança dos recursos naturais de cada país, propor melhorias marco legal e institucional e nas políticas públicas de modo a garantir

As Diretrizes tratam de vários temas com um enfoque de direitos humanos e estão assentadas em práticas adotadas e difundidas pelas comunidades rurais e em diversos compromissos internacionais. O documento com as Diretrizes está organizado em sete partes, contendo objetivos, princípios orientadores, direitos e responsabilidades relacionados à posse dos recursos naturais com ênfase nas suas formas de reconhecimento jurídico, de cessão (áreas públicas, áreas de povos indígenas e comunidades com sistemas tradicionais de posse etc.) e de transferência (reformas redistributivas, restituição, expropriação, investimentos responsáveis etc.). Trata, também, de aspectos da administração da posse (como registros, cadastros, tributação, solução de controvérsias etc.).

Para poder aproveitar todo o seu potencial um primeiro passo é conhecer bem o documento das Diretrizes e depois buscar identificar aqueles dispositivos que podem ser mais úteis em cada situação. E tudo isso poderemos fazer juntos, aqui neste fórum.

 

Caio Galvão de França

ACTUAR, a REDSAN-CPLP e a Fundação Land Portal convidam todos os membros da Comunidade Terra da CPLP[1] a participar neste Debate sobre o Pacto para a Melhoria da Governança da Terra na CPLP, convocando as Organizações da Sociedade Civil, as Organizações não-Governamentais e as Organizações de Base, bem como Indivíduos e Comunidades Locais, Académicas, Empresariais e Profissionais, e os Órgãos e Agentes Públicos, bem como os Profissionais de Média e Jornalistas, e outros (as), com vista a uma melhor compreensão das espectativas e das necessidades de todos os elementos envolvidos no sistema de segurança alimentar e nutricional das populações da região e nos seus países membros, contribuindo para a melhoria da Governança da Terras na CPLP, em conformidade com as Diretrizes Voluntárias de Governança Responsável de Terra, Pescas e Recursos Florestais no contexto da Segurança Alimentar Nacional, e visando cumprir a Agenda 2030 para os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.


As Vossas contribuições são bem vindas para aprofundar a discussão em torno deste tema fundamental para o assegurar da segurança alimentar e nutricional das populações dos países membros da CPLP.  


Todos estão convidados a participar e a exprimir os seus pontos de vista, sendo fundamental cobrir todas as perspetivas de debate e de todos os grupos de interesse, envolvendo todos os interessados e beneficiários, incluindo os mais vulneráveis, e assim promover os melhores arranjos para melhorar a governança da terra nos seus territórios.


Convido-vos também a preencher o QUESTIONÁRIO ONLINE, que permite a recolha sistemática de elementos que contribuem para a mais adequada articulação operativa do Pacto para a Melhoria da Governança da Terra na CPLP.


Sejam então bem-vindos!


[1] CPLP: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor Leste.

 

(...) "caso as condições de acesso à terra provoquem, no meio rural ou no meio urbano, desigualdades intensas e insegurança" (Sarmento 2017), podem vir a desencadear conflitos.

Por outro lado, as políticas fundiárias, ao estabelecerem a segurança da posse da terra e outros recursos naturais, podem contribuir para a prevenção desses mesmos conflitos e "incentivar o investimento," podendo "também contribuir para a confiança e para o crescimento económico." 

(in Mensagem de abertura do debate online sobre O Pacto para a Melhoria da Governança da Terra na CPLP)

 

E no seu país/território, o que se passa?

 

a) Conhece algum caso que possa documentar a existência de problemas relacionados com a posse de terra?

*O quê?

*Onde?

*Quando?

*Quais foram as consequências para a agricultura familiar da região?

*A segurança alimentar foi afectada?

*Houve violência?

 

b) E conhece algum caso que possa documentar o bom desfecho de conflitos reais ou potenciais relacionados com a posse de terra?

*O quê?

*Onde?

*Quando?

*Que soluções e acordos foram alcançados?

*A agricultura familiar foi reforçada?

*Aumentou a Segurança alimentar?

 

Envie-nos o seu comentário 

ou responda através do link *Conflitos e Soluções de posse de Terra

 

 

Caros colegas, 


 


Em nome do Mecanismo de Facilitação da Participação da Sociedade Civil da CPLP (MSC-CONSAN), damos as boas-vindas a este debate virtual sobre o Pacto Multi-atores para a Melhoria da Governança da Terra na CPLP. 


 


Como sabem, este tem sido um tema de discussão prioritário para o MSC-CONSAN, e foi alvo de uma Mesa de Discussão específica no último Forum sobre Agricultura Familiar e Segurança Alimentar e Nutricional da CPLP (FAFSAN II), que teve lugar em Setembro de 2016, na sede da CPLP, em Lisboa. 


 


Nessa oportunidade, representantes do Mecanismo das Universidades, do do Mecanismo dos Parlamentares e do Mecanismo do Setor Privado juntaram-se a convite do MSC-CONSAN, tendo concordado na importância de constituir um Pacto Multi-atores para a Governança Sustentável da Terra, que garanta o acesso equitativo e seguro à terra nos nossos países. 


 


Afinal, o acesso seguro à terra está diretamente ligado a reduções significativas da fome e da pobreza; seguindo a mesma abordagem, o direito à alimentação é fortemente posto em risco quando os direitos de posse não são garantidos.


 


A interdependência profunda entre direito à alimentação e direitos de posse é explicitada nas Diretrizes voluntárias em apoio à realização progressiva do direito à alimentação adequada no contexto da segurança alimentar nacional (ver Diretriz 8B - Acesso à terra) e no Prefácio das Diretrizes Voluntárias sobre a Governança responsável da Terra, dos recursos Pesqueiros e Florestais no contexto da segurança alimentar nacional, que sublinha:


 


“O propósito destas Diretrizes Voluntárias é servir como referência e orientar o aprimoramento da governança fundiária da terra, dos recursos pesqueiros e florestais, com o objetivo primordial de garantir a segurança alimentar para todos e apoiar a conquista progressiva do direito a uma alimentação adequada no contexto da segurança alimentar nacional”.


 


Reconhecendo que uma governança fundiária responsável promove o desenvolvimento social e económico sustentável, e contribui para a redução da pobreza e da insegurança alimentar, a sociedade civil da CPLP tem defendido uma governança descentralizada e democrática da terra, a partir das pessoas e das comunidades, através do fortalecimento dos órgãos de governança da segurança alimentar e nutricional a nível nacional e regional


 


Nesse sentido, os conselhos nacionais e regional de segurança alimentar e nutricional na CPLP poderão constituir-se em espaços privilegiados para a melhoria da governança fundiária. Estes espaços poderão, inclusive, contribuir para a operacionalização e o monitoramento efetivo da própria implementação das Diretrizes Voluntárias sobre a Governança responsável da Terra, assim envolvendo e estimulando a participação de todos os atores relevantes na governança fundiária na região


 


Nesse sentido, resgatamos algumas das questões levantadas por ocasião do lançamento do debate: que papel este espaço multi-atores poderia ter na produção de análises, indicações e posicionamentos; na recolha, sistematização e debate de dados, informações, documentos; no monitoramento contínuo da implementação das Diretrizes sobre Governança da Terra?

#1 Publica-se o primeiro relato de conflitos de terra, em Portugal

a) A posse de terra é impossível para a classe média em Portugal. Ultimamente os preços foram inflacionados pela quantidade enorme de estrangeiros que podem chegar e comprar mesmo sem residir ou pagar impostos no país. Num futuro próximo adivinham-se mais compras para agricultura intensiva (olivais e estufas e eucalipto) por grandes investidores estrangeiros que de seguida abandonam as terras inférteis. Um cenário devastador para o jovem que vive no meio rural.

 

b) Há tentativas de colectivos, cooperativas ou grupos de amigos ou comunidades intencionais, para comprar terra. Há também a tentativa de desenvolvimento do conceito de co-gestão e de stewardship. A ver os resultados no futuro.

 

fonte; questionário online *Conflitos e Soluções de posse de Terra

Enviado a 27/04/17, 15:41

#2 Moçambique

Foram apontados casos, mas será que os podem descrever melhor?

No conflito nas plantações florestais em Macambique

  • quais foram as consequências para a agricultura familiar da região?
  • A segurança alimentar foi afectada?
  • Houve violência?

e em Majune, Niassa,

  • Que soluções e acordos foram alcançados?
  • A agricultura familiar foi reforçada?
  • Aumentou a Segurança alimentar no Distrito?

a) Conhece algum caso no seu território/país que possa documentar a existência de problemas relacionados com a posse de terra?

Sim conheço ; relacionada com conflito nas plantações florestais da Província do Niassa no norte de Macambique

b) E conhece algum caso que possa documentar o bom desfecho de conflitos reais ou potenciais relacionados com a posse de terra?

Sim na Província do Niassa . Distrito de Majune

 

fonte; questionário online *Conflitos e Soluções de posse de Terra

Enviado a 28/04/17, 07:01

Em Angola a terra é do Estado, mas não é o próprio Estado que faz a gestão da mesma mas sim é delimitada somente para os poderosos, Generais, Ministros, Governadores, Administradores e grandes mandatários do Partido no poder. O cidadão coitado, indígena não tem nem sequer um lugar seguro sendo ele o povo.

Em Angola encontram-se placas fundiárias do Estado onde já vivem pessoas desde 1940, antes da independência, terrenos que até o governo português já tinha dado aval como propriedade do povo, mas o Governo angolano não se importa: desapropria; demole casas que já estão construídas a mais de 60 anos; mata aqueles que tentam abrir a boca; os poderosos ocupam hectares e hectares de terra alegando como fazenda ao passo que nenhuma galinha tem. Isso parece como se tivéssemos a viver o período da Suserania e da Vassalagem.

Daquilo que se conhece quer no ponto de vista político como religioso, a terra é propriedade do povo porque primeiro vem o povo depois o Estado que é resultado da organização do mesmo povo. Essa é a situação que se vive em Angola como prova disso, pode se ter como prova as delimitaçãoes dos terrenos a partir do Ramiro até Porto Amboim, tudo aquilo está repartido entre os poderosos partindo da estrada Nacional até à praia.

Isso indica que a Governança de Terra em Angola passa para o servir-se do que ao organizar-se.

#3 Brasil

a) Conhece algum caso no seu território/país que possa documentar a existência de problemas relacionados com a posse de terra?

No Brasil há muitos conflitos pela posse da terra, envolvendo diferentes situações e diferentes setores - camponeses, indígenas, comunidades quilombolas, extrativistas, entre outros - e que resultam em diferentes tipos de violência sobre as comunidades rurais. Todo ano, a Comissão Pastoral da Terra, que faz parte da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil da Igreja Católica, divulga um relatório sobre a situação dos conflitos no campo (ver www.cptnacional.org.br). Há conflitos relacionados à resistência na terra por camponeses ameaçados de expulsão pela expansão do agronegócio e por grandes obras de infra-estrutura; conflitos na luta pela reforma agrária com a redistribuição de terras; conflitos decorrentes da defesa dos seus territórios pelos povos indígenas diante de projetos de exploração mineral e da expansão da produção agroepecuária e florestal; conflitos para garantir o reconhecimento dos territórios das comunidades quilombolas e o acesso de comunidades tradicionais aos recursos florestais.

 

b) E conhece algum caso que possa documentar o bom desfecho de conflitos reais ou potenciais relacionados com a posse de terra?

Destaco da experiência da brasileira dois aspectos. O primeiro refere-se à capacidade de organização e mobilização dos movimentos e organizações das populações rurais, tanto para organizar ações de defesa das suas terras e dos seus territórios, construindo alianças com outros setores da sociedade civil, divulgando as consequencias negativas para o país da estrutura fundiária concentrada e da legitimidade dos seus direitos à terra; como para pressionar o o governo federal para implementar políticas públicas de reforma agrária e de reconhecimento dos direitos territoriais das comunidades rurais. O segundo aspecto refere-se à criação de uma estrutura estatal destinada a mediação e superação de conflitos fundiários, a Ouvidoria Agrária Nacional, que, até o ao passado, era vinculada diretamente ao gabinete do Ministro do Desenvolvimento Agrário. A Ouvidoria tinha uma atitude pró-ativa e, junto com outras áreas de governo e da sociedade civil, elaborou o Plano Nacional de Combate à Violência no Campo, que resultou na criação de áreas especializadas na Justiça Federal e no Ministério Público e em alterações nos procedimentos judiciais e policiais em ações despejo, para que considerassem previamente o ponto de vista dos camponeses e dos órgãos responsáveis pelas políticas de terras antes de qualquer decisão e para que levassem em conta o que estabelece a Constituição Federal de que o direito de propriedade da terra está subordinado ao cumprimento de uma função social e ambiental.. A extinção do MDA e a desestruturação da Ouvidoria Agrária Nacional impactam negativamente a capacidade do Estado brasileiro para tratar destes conflitos.

fonte; questionário online *Conflitos e Soluções de posse de Terra

Enviado a 28/04/17, 14:32

Caríssimos, 

Partilhamo-vos alguns excertos da secção 3 sobre " O Contexto da CPLP" do Documento de Apoio da mesa de Governança da Terra e Outros Recursos Naturais, do 2º Fórum da Segurança Alimentar e Nutricional da CPLP. O documento integral pode ser acedido aqui.

 

3. O contexto da CPLP

Os Estados-Membros da CPLP enfrentam igualmente importantes desafios neste campo, como o aumento da pressão comercial sobre a terra e sobre outros recursos naturais e produtivos; e a crescente compra estrangeira de terras para fins não agrícolas (minerais e petróleo em Angola; biocombustíveis em Moçambique; turismo em Cabo Verde e São Tomé e Príncipe). Os deslocamentos de populações devido a estes empreendimentos e a distribuição desigual de terras tem relegado um número crescente de agricultores familiares para áreas marginais (Actuar, 2014).

Relativamente aos quadros legais, a Lei de Terras 9/2004 de Angola sublinha o papel do Estado na proteção dos direitos fundiários dos povos. Reconhece e define os direitos comunitários e sistemas consuetudinários, mas explicita que os terrenos das comunidades rurais podem ser expropriados por utilidade pública ou ser objeto de requisição, mediante justa indemnização. Em 2014 o Governo iniciou um processo de auscultação sobre implementação da Lei de terras, que poderá levar a uma revisão da legislação.

Têm tido lugar demarcações de terra (cujo objetivo é ceder a titularidade da terra) que impossibilitam as populações tradicionais de aceder a terras tradicionalmente ocupadas para alimentação e/ou pastoreio (Actuar, 2014), existindo evidências de sobreposição de direitos. Porém, têm sido feitas igualmente demarcações em favor das comunidades locais, em várias províncias, cujo objetivo é reconhecer os direitos e formalizá-los dentro do marco legal.

Não existem cadastros atualizados.

No Brasil, a legislação mais recente sobre terra são o capítulo sobre Política Agrária da Constituição Federal de 1988 e a lei que o regulamenta (Lei 8629 de 1993). A questão fundiária no Brasil vai além da distribuição de terras e torna-se uma problemática centrada nos processos de ocupação e afirmação territorial, remetendo, dentro do marco legal do Estado, às políticas públicas de ordenamento e reconhecimento territorial (entre outros, os Planos Nacionais de Reforma Agrária). Existem órgãos com competência para delimitar e regularizar as terras dos povos indígenas e outros povos tradicionais como as comunidades remanescentes de quilombos.

Em Cabo Verde, o quadro legal consiste no Decreto Legislativo n.º 2/2007, que prevê que quer entidades públicas como privadas, singulares ou coletivas, têm direito à titularidade de solos. A lei é aplicada apenas no que tange ao solo urbano dada a inexistência de regulamentação sobre a utilização de solos para agricultura, silvicultura, pecuária ou turismo rural. As instituições governamentais regulam a gestão dos usos da terra com base nas leis existentes (código civil e outros) e no reconhecimento dos direitos tradicionais.

Existem mecanismos de resolução de conflitos pelo uso e posse de terra, como o Código de postura, tribunais, provedor da justiça. A mesma lei postula sobre mecanismos de indemnização nos casos de expropriação. Não existem, porém, mecanismos de governança territorial com participação de agricultores familiares, camponeses e comunidades tradicionais.

Em termos de registos, existe um Registo Predial facultativo, assegurado pela administração central nas conservatórias e que prova a titularidade da propriedade; e um Registo Matricial, que é obrigatório e assegurado pela administração autárquica para efeitos fiscais (FAO, 2008).

Na Guiné-Bissau, estão vigentes a Lei da Terra - Lei N.º 5/98 - e o direito consuetudinário - “Duno di Tchon”. A Lei da Terra prevê que o Estado é o proprietário da terra, que a concede através de requerimento formal aos ocupantes tradicionais. Em caso de necessidade, o Estado recupera a posse da terra. Tradicionalmente, a terra pertence ao fundador da tabanca, que é o responsável pela sua distribuição pelos ocupantes locais.

A regulamentação da lei foi formulada, com o apoio da FAO, e aprovado pelo governo em 2008. Porém, nunca chegou a ser ratificado pela Assembleia Nacional Popular, inviabilizando assim a sua entrada em vigor e sua aplicação. O quadro legislativo não é divulgado junto das comunidades rurais. A falta de recursos humanos, financeiros e materiais limita igualmente a gestão dos diferentes usos da terra por parte das entidades governamentais.

Existem mecanismos judiciais e sistemas tradicionais de resolução de conflitos pelo uso e posse de terra e mecanismos de indemnização nos casos de expropriação.Também neste país não estão definidos mecanismos de governança territorial com participação dos agricultores familiares e o processo de criação de um Conselho Nacional de Segurança Alimentar não tem avançado.

Em Moçambique, não existe um Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Do ponto de vista institucional, a estrutura responsável pela coordenação das ações de SAN é o Secretariado Técnico de Segurança Alimentar e Nutricional (SETSAN) que tem assumido algumas caraterísticas de monitoramento e participação da sociedade civil, na medida em que congrega diferentes setores de governo e grupos de trabalho.

Em relação ao ordenamento do território, existe um zoneamento agroecológico e planos de maneio e uso da terra e processos de demarcação de terras que conferem limites e concedem poder para estabelecimento de parcerias, reduzindo a vulnerabilidade das comunidades e a ocorrência de conflitos de limites de terra entre as comunidades.

Existem mecanismos de governança territorial com participação de agricultores familiares, camponeses e comunidades tradicionais, os conselhos consultivos locais. Tais conselhos representam também mecanismos de resolução de conflitos a par com os mecanismos judiciários. A lei prevê consultas inclusivas, porém muitas vezes não têm sido realizadas quando se trata de grandes investimentos.

A Constituição portuguesa de 1975 trata da questão da terra no âmbito das políticas agrícolas, sendo um dos objetivos garantir o acesso à propriedade ou à posse da terra e demais meios de produção por parte daqueles que a trabalham. A Constituição prevê igualmente processos de ordenamento e reconversão agrária, isto é tanto de emparcelamento como de parcelamento. Sendo que, no caso de expropriação, as terras devem ser entregues, a título de propriedade ou posse, a pequenos agricultores, a cooperativas de trabalhadores ou de pequenos agricultores. Constitucionalmente, apenas o subsolo é considerado de domínio público.

Os regimes de posse, usucapião e propriedade estão previstos no Código Civil e o Código de Registo Predial regula o registo da propriedade. O cadastro predial ainda não foi concretizado em nenhuma parte do país, existindo apenas o Cadastro Geométrico da Propriedade Rústica realizado em metade sul do País (Beires et al., 2013).

Os espaços terrestre e marítimo são alvo de diferentes tipos de ordenamento e planeamento de usos, a nível nacional e municipal. Existem dois documentos norteadores, a Reserva Agrícola Nacional e a Reserva Ecológica Nacional. No entanto, os vários instrumentos nem sempre se encontram coordenados ou não existem meios suficientes para os implementar.

Em 1991, o Estado são-tomense promulgou a Lei n.º 3/91 e o Decreto-Lei n.º 51/91 que regulam o acesso à terra. Esta legislação tem como objetivo parcelar as terras do Estado e determina o uso das terras para fins compatíveis com os seus objetivos; cria incentivos para os utilizadores cultivarem a terra no máximo do seu potencial económico e aumentar o seu valor; identificam os métodos de transferência dos direitos de propriedade; e definem zonas específicas para o desenvolvimento urbano, da agricultura, do turismo e das reservas florestais.

A lei tem sido aplicada em todo o país e não é discriminatória na sua aplicação com respeito às mulheres e jovens. Tem, porém, algumas lacunas e está, neste momento, a ser revista com o apoio da FAO. O governo é consciente da necessidade de reforma da lei de terra. No documento Strategic Development Plan (SDP), que aponta a uma visão do país até 2020, informa-se que uma nova Lei de Terra está a ser preparada.

A partir do Projeto de Privatização da Agricultura e Desenvolvimento de Pequenas Propriedades foram distribuídos 28367,48 hectares de terra arável, por 9.129 pequenas parcelas familiares (com superfície até 10 ha) e 230 médias empresas, entre 1993 e 2005 (FAO, 2008). A estes agricultores foi atribuído um título provisório que lhes dá direito à exploração da sua parcela de terra. Caso os agricultores abandonem as suas parcelas e as deixem improdutivas, o governo pode retirá-la e entregá-la a outro agricultor que necessite ou a um jovem residente na comunidade que nunca tenha sido possuidor de terra. Por falta de apoios e incentivos, em muitos casos, as famílias abandonaram as suas parcelas e o Estado tem vindo a recuperar estas parcelas (Actuar, 2014).

Os sistemas de demarcação e cadastro são deficitários e desatualizados, mesmo no que tange às terras distribuídas, sendo um dos principais problemas a falta de meios humanos, equipamento e orçamento dos serviços públicos (FAO, 2008).

O Governo timorense aprovou recentemente (2016) a Lei de Bases do Ordenamento do Território, que prevê a existência de planeamento territorial de âmbito nacional e municipal; e a lei do Regime especial para a definição da titularidade dos bens imóveis. Esta última define que os direitos de propriedade reconhecem os direitos adquiridos validamente durante precedentes administrações. Cria a figura dos direitos informais de propriedade e zonas de proteção comunitária, reconhecendo assim a propriedade comunitária. O acesso à terra será garantido através do Cadastro Nacional de Propriedades, no sentido da criação de um mercado de bens imóveis transparente.

Em 2015, foi criado o Conselho Nacional para a Soberania, Segurança Alimentar e Nutrição em Timor-Leste (KOSSANTIL).

 

 

Não lhes falarei aqui como estudiosa do tema, porque não sou, mas como testemunha de fatos recentes. Em fevereiro estive em Minas Gerais, lá conheci algumas famílias que moram nos arredores do Parque Nacional da Canastra e que vêm pleiteando o reconhecimento como povos tradicionais e o direito de permanecer em suas terras. Na região o conflito existe há mais de 40 anos, envolve a preservação ambiental, a mineração e o direito à posse da terra. De um lado uma legislação ultrapassada que não considera que seja possível a atividade humana em áreas de preservação ambiental, de outro o poder das mineradoras. Descobri ai que os canastreiros que vivem nas áreas de litígio sabem dominar o fogo e cuidar que ele não se alastre, já os 70.000 hectares do parque, que corresponde à área desabitada não há tecnologia que consiga controla-lo e, ano após ano, o parque se vê em chamas. Enquanto isso, os canastreiros vivem nos arredores assombrados pelas lembranças de como foram expulsos da área que hoje abriga o parque, com medo que lhe tomem as terras que restaram e que, nesse jogo, apenas as mineradoras se mantenham no direito de permanecer na região. 

Não é muito diferente a situação dos povos remanescentes de quilombolas que vivem na região de Registro, em São Paulo, algumas famílias estão há muitas décadas lutando pela legalização da posse de suas terras. Na semana que passou, ouvi em Registro um lamento muito parecido ao dos canastreiros:  a Legislação florestal não lhes permite realizar suas atividades na mata que lhes permita a subsistência. Os técnicos presentes validaram essas reivindicações como procedentes.

No dia primeiro de maio, presenciei o protesto inflado de um maranhense contra o genocídio do Povo Gamela, indígenas de seu Estado lutando para permanecer em suas terras. Um ataque de fazendeiros que resultou em mãos decepadas, feridos e baleados entre aquele povo.  Fato que quase não se viu na mídia.

É um pouco do que vi e ouvi, só nesses últimos meses...

Uma plataforma como está pode representar um espaço de reflexão e alerta para casos como estes.

Apesar de haver muitas coisas que os diferenciem os paises da CPLP possuem  muito em comum.

Foram países que tiveram, de alguma forma, pela matriz colonial que tiveram, pelos processos de independência, pela opção socialista e também coincidentemente pela opção pela economia de mercado mais ou menos pelas mesmas épocas, de um ponto de vista institucional e legislativo,  uma base muito próxima.

A propria nacionalização das terras que segundo alguns autores,não correspondeu em todos o necessariamente a uma opção de carácter político-ideológico, mas uma situação também pragmática colocada no imediato no abandono das terras pelos seus proprietários, normalmente empresários que  por motivos de força maior foram obrigados a sair dos paises.

Note-se que, nessa visão,  os governos não poderiam talvez permitir que a simples presença ou ocupação dessa terra garantisse o direito de posse.

É claro que as opções também foram influenciadas pelo momento que se vivia e pelas opções de carácter político que a maioria dos países vivia nesse período. Da mesma forma, com a abertura da economia, na realidade, foi-se gerando um mercado paralelo de terras. A terra, apesar de tudo sendo pública e não podendo ser transacionada, na prática acabava por ser transacionada.

Hoje temos um novo contexto onde há uma forte pressão sobre terra, em particular em África. Em África porque é a bola da vez, digamos assim, no sistema alimentar em termos da produção de alimentos, sobretudo alimentos que entram no mercado internacional. Não será estranho a isto a proximidade de África em relação aos maiores mercados alimentares em crescimento como é o caso do mercado Asiático.

Mas também não será estranho a isto o facto de, em África, termos uma fragilidade do ponto de vista legal, institucional, maior do que noutras regiões, o que torna os investimentos na agricultura intensiva neste continente mais atrativa face á redução global nas margens de lucro no sector agroalimentar.

Pese embora alguns países da CPLP estarem relativamente protegidos desta procura global por terra, esta pressão, certamente vai aumentar. Sabe-se perfeitamente que, em Moçambique, o processo de investimento em grandes áreas de terra iniciou-se antes de Angola. Há notícias sobre conflitos, há notícias sobre diferendos relativamente às terras que foram utilizadas em alguns projetos.

Em Angola a situação esteve um pouco mais protegida até ao momento por uma série de fatores, até pela própria opção de Angola pela receita do petróleo em detrimento do desenvolvimento da agricultura. Temos situações contrárias, como a de São Tomé e Príncipe onde foi feita uma reforma agrária que distribuiu maciçamente a terra das antigas roças de produção de café e de cacau, gerando (pelo menos esse o objetivo) uma classe de agricultores familiares que hoje permanece, se desenvolve e se consolida pelo fato de ter tido acesso a essa terra. Por outro lado, vai dividindo essa terra cada vez mais na medida em que as famílias continuam a ser numerosas e, portanto, pelo sistema de heranças, hoje começa a não haver terra para os jovens em São Tomé e Príncipe.

Portanto, há alguns traços comuns que gostaria de resumir: alguma insegurança relativamente à posse e uso da terra seja ela para os agricultores familiares seja ela para os investidores em projetos de desenvolvimento agrícola (nacionais ou eventualmente relacionados a investidores estrangeiros); existência de alguns conflitos sobre a terra e não é apenas nos países africanos.

Existe, portanto, necessidade de maior diálogo para, pontuando aqueles que são os problemas comuns aos vários países e os interesses dos vários atores relevantes nesta matéria, encontrar alguns pontos de acordo que configuram um  Pacto para melhorarmos a governança da terra nos países da CPLP.

As Diretrizes voluntárias aprovadas pela FAO são um instrumento muito relevante e muito importante e na CPLP temos condições de andar mais rápido na sua implementação . Acho que o facto de haver uma língua comum permite a geração de um ativo muito importante que é o ativo da confiança entre os diferentes atores envolvidos. Com isto podemos caminhar mais depressa e ...juntos. 

#4 Guiné Bissau

a) Conhece algum caso no seu território/país que possa documentar a existência de problemas relacionados com a posse de terra?

Instalação da empresa agrogeba na bacia do rio Geba com objetivo de produzir arroz

 

fonte; questionário online *Conflitos e Soluções de posse de Terra

Enviado a 29/04/17, 07:54

Submitted by Maria emília on Tue, 11/21/2023 - 13:37

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Maria Emília Lisboa Pacheco. Assessora da Organização Não Governamental FASE-Solidariedade e Educação. Participante do Forum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional e da Articulação Nacional de Agroecologia. Ex-presidenta do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional

Saudamos a iniciativa deste debate.  Concordamos com os comentários de Caio França que nos diz que “o Relatório Base, que indicava a situação do país (Brasil) tendo por base o ano de aprovação das DVGT e que deveria ter sido internalizado pelo INCRA e demais áreas do MDA, não foi apresentado e discutido nas instâncias e mecanismos de participação social dos conselhos de políticas públicas relacionados às DVGT, em especial, o CONSEA e o CONDRAF”.

Mas podemos também afirmar que no Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, ao debatermos a questão do acesso à terra e direitos territoriais e sua relação com o Direito Humano à Alimentação, nos remetemos às DVGT. Consideramos a indivisibilidade do Direito à Alimentação e do Direito à Terra e ao Território, uma vez que os modos de organização, os sistemas tradicionais de apropriação e uso da terra, e as culturas alimentares dos povos indígenas, camponeses e comunidades tradicionais estão estreitamente ligados aos modos de vida, não podendo ser tratados de forma dissociada.

Sem pretender alongar-me na história, é preciso dizer que, no Brasil, a questão da terra e dos direitos territoriais continua a se situar no centro do conflito social. Ela alimenta a profunda desigualdade e a tradicional relação entre propriedade, poder político e poder econômico.

A questão  agrária no Brasil é a história dominante da propriedade privada da terra. O  processo de concentração de terra, adquiriu vários formatos de concessões e favorecimento de grandes extensões de terras às classes dominantes desde a colonização. É a história do genocídio dos povos indígenas, da escravidão, e também  da imigração de agricultores da Europa e da Ásia. Quando foram libertados os escravos, no século XIX, a compra de terras firmou-se como instrumento jurídico de acesso à terra,  excluindo os pobres e ex-escravos (Lei de Terras de 1850).

As propostas de reformas de base no século XX, dentre as quais se incluía a Reforma Agrária, foram afastadas pelo golpe militar na década na década de 1960.

Não tivemos capítulos de mudança  estrutural em nossa história agrária. Não há registro de uma verdadeira Reforma Agrária, com reestruturação fundiária, embora tenhamos tido Planos de Reforma Agrária e o desenvolvimento de assentamentos agrários. Também   nunca houve sequer uma discriminatória de terras no país, para identificar as terras públicas. Os mecanismos fraudulentos de registro de terra por parte de supostos proprietários impulsionaram processos de expropriação do campesinato pelos atos que denominamos de grilagem e terras, sustentados de forma recorrente por atos de violência dos grandes proprietários contra os camponeses.

As lutas de resistência e proposições do campesinato, dos povos indígenas e comunidades tradicionais marcam a nossa história e são expressão de uma conflitualidade permanente na defesa da terra e do território, resultando, por exemplo,   em algumas conquistas plasmadas na Constituição Brasileira de 1988. 

Esta legislação expressou a formação pluriétnica do país, reconheceu o direito a diferença cultural e definiu como "direitos coletivos" o direito das populações ao seu território tradicional, a sociodiversidade, ao patrimônio cultural, ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e o direito à  biodiversidade.

Mas manteve-se  a segmentação da questão agrária e agrícola, favorecendo a visão da questão da distribuição da terra como questão de política social e não uma contraposição e questionamento ao modelo de desenvolvimento.   

Iniciamos e seguimos o século XXI com a  dívida histórica da democratização do acesso à terra aos camponeses e garantia dos territórios aos povos indígenas, comunidades quilombolas e demais comunidades tradicionais nos governos de perfil democrático-popular entre 2003 e 2016. Nesse período, a territorialização camponesa seguiu em ritmo menor do que a territorialização do agronegócio baseado no modelo agroexportador de commodities.  

O índice de Gini aumentou, mantendo a concentração fundiária. Entre 1998 e 2014, segundo dados da equipe do Prof. Bernardo Mançano da UNESP, na área das propriedades com mais de 100 mil hectares cresceu em 372%. As ações de desapropriação para assentamento dos camponeses foram praticamente paralizadas, especialmente a partir de 2012,  assim como a titulação de terras dos povos indígenas e de comunidades quilombolas. As Unidades de Conservação, sobretudo aquelas definidas de uso sustentável, a exemplo das Reservas Extrativistas, consideradas uma resposta adaptada à realidade do Bioma da Amazonia e modos de vida de suas comunidades tradicionais também não foram priorizadas.

Mas não podemos deixar de reconhecer a importancia de programas de fortalecimento da agricultura familiar, a partir de 2003, como modalidades de  crédito do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf); comercialização e segurança alimentar e nutricional no Programa de Aquisição de Alimentos – PAA e, Programa Nacional de Alimentação -PNAE, Programa de preço mínimo dos produtos da sociobiodiversidade - PGPMBio, Programa Bolsa Família,  Programa um milhão de cisternas ( P1Mc) e o Programa Uma terra duas águas ( P1+2) no Semiárido brasileiro.  Dentre as políticas que favorecem a agricultura  familiar e das comunidades tradicionais, elencamos a Política Nacional de Segurança Alimentar a Nutricional, a Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica e a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais.

Não há soberania e segurança alimentar e nutricional  sem a garantia do acesso à terra e aos direitos territoriais. Assim nos manifestamos insistentemente nos últimos anos no Conselho Nacional de Segurança Alimentar a Nutricional (Consea).  Esta visão conjuga, o direito à terra,  à água, e ao  livre uso da biodiversidade e sistemas de produção e consumos sustentáveis, baseados na agroecologia, como tem sido crescentemente defendido pelos movimentos sociais no Brasil.  

Com o golpe, a partir de 2016, o Consea manifestou-se contra  o processo de desmonte das políticas e violação dos direitos.  Foi elaborado um documento para debate sobre “Políticas Públicas de Segurança Alimentar e Nutricional – Análise de Conjuntura” – “Monitoramento da Sociedade Civil do Consea”, em novembro de 2016, uma análise a partir das diretrizes da Política de Segurança Alimentar e Nutricional. 

Registramos, dentre outras, críticas e denúncias:

  • A reestruturação do Poder Executivo com a extinção do Ministério de Desenvolvimento Agrário e do Ministério das Mulheres, Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos; o enfraquecimento do  Instituto Nacional de Colonização e  Reforma Agrária com a redução do seu orçamento;
  • Aprovação da drástica proposta de Emenda Constitucional (nº 95 de 15 de dezembro de 2016), que determinou que as despesas primárias, incluindo as que garantem os direitos sociais serão limitadas ao valor do exercício anterior e ficarão congeladas por 20 anos; 
  • Alteração no regramento de políticas e programas como o exemplo do Programa Bolsa Família e  Programa de Aquisição de Alimentos, que já vinha sofrendo restrições em algumas de suas modalidades no governo anterior, dificultando o acesso pela população;
  • Propostas de mudanças na legislação sobre titulação de lotes dos assentamentos da reforma agrária, com a finalidade de facilitar a arrecadação privada das terras. Hoje os títulos concedidos são inegociáveis. Alteração na legislação com adoção de  medidas para facilitar a estrangeirização das terras;
  • Recriação da Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar ações da Fundação Nacional do Indio (Funai) e do Incra na demarcação de terras indígenas e das comunidades quilombolas, que resultará em criminalização servidores, lideranças e deslegitimação dos direitos desses povos;
  • Execução de reintegrações de posse em favor de fazendeiros, sobretudo em terras tradicionalmente ocupadas como dos povos Guarani e Kaiowá;
  • Medidas que ameaçam o Direito Humano à Alimentação Saudável, com a flexibilização da lei dos agrotóxicos; alteração da rotulagem dos transgênicos, com a retirada do símbolo “T” nos produtos que contem até 1% de componentes transgênicos; aprovação de Lei de Acesso aos Recursos Genéticos sem a real garantia dos direitos dos povos e comunidades tradicionais; ameaça de aprovação de Lei de Cultivares que aumenta o monopólio sobre as sementes;
  • Proposta de mudança do Código da Mineração e simplificação do licenciamento ambiental para os grandes empreendimentos. No Brasil, o Estado tem domínio do subsolo, acima da lei de propriedade da terra, que está restrita ao solo. Mas hoje, entre as diversas propostas em debate no Congresso Nacional estão as que liberam a extração mineral em terras indígenas e há iniciativas de prospecção mineral em antigos assentamentos de Reforma Agrária, ameaçando a expulsão das famílias assentadas em programas governamentais. 

O CONSEA manifestou-se também contrário ao Projeto de Emenda Constitucional n° 215, de 28 de março de 2000, em tramitação no Congresso Nacional, que  estabelece como competência exclusiva do Congresso Nacional a aprovação da demarcação, titulação e homologação de terras indígenas, quilombolas e a criação de Áreas de Proteção Ambiental, ferindo assim o art. 231 e o art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal do Brasil. Também se manifestou por meio da Recomendação n° 001/2012 ao Supremo Tribunal Federal, solicitando que julgue improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n° 3.239 dirigida contra o Decreto n° 4.887, de 20 de novembro de 2003, que regulamenta o domínio das terras das comunidades quilombolas.  

 

Esses são exemplos, do quadro recessivo, que se dá em um cenário também de aumento da violência no campo. Em 2016, registraram-se 1.536 conflitos no campo, somando-se os conflitos por terra, água e conflitos trabalhistas, e um total de 61 assassinatos.    

O debate atual sobre a governança da Terra se dá em um momento da história do  aprofundamento do modelo hegemônico, baseado na chamada Revolução Verde, que se renova ampliando processos de acumulação capitalista e “despossessão”,  em um contexto de crises alimentar, climática, energética. A terra voltou ao centro da agenda com a crescente demanda pelos “4Fs”: food (alimentos), fiber (fibras ou ração), fuel ( combustíveis ou energia) e forest (florestas, madeira, celulose e carvão). Esse 4 Fs não abarcam ou  não explicam a demanda também por água e minérios, que também cresce no Brasil. Por isso entendo que a importancia da terra é renovada e ganha centralidade, mas coloca-nos questões que vão além de um problema agrícola ou agropecuário.

 

Mapear a expressão da questão agrária com suas várias dimensões nos países da CPLP é importante. Também considero a necessidade de aprofundarmos o sentido e alcance dos instrumentos internacionais que favoreçam a luta de resistência dos sujeitos de direitos que são os camponeses, povos e comunidades tradicionais que garantem o nosso alimento. Aqui se coloca, por exemplo, a importancia da Convenção 169 da OIT, que não apenas reforça instrumentos de redefinição da política agrária, mas também favorece a aplicação da política ambiental e de políticas étnicas, permitindo dialogar com a Convenção sobre Diversidade Biológica e o Tratado Internacional sobre os Recursos Fitogenéticos para a Alimentação e Agricultura (TIRFAA).

Submitted by Caio Galvão de… on Tue, 11/21/2023 - 13:37

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Uma das primeiras experiências de monitoramento regional das Diretrizes está em curso na Reunião Especializada sobre Agricultura Familiar do MERCOSUL (bloco de países da América do Sul formado pelos paises membros Argentina, Paraguai, Uruguai, Brasil e Venezuela, além do Chile, Equador e Bolívia como associados). Participam da REAF representantes de governos e da sociedade civil e ela se organiza por grupos temáticos; um deles trata do tema da terra. A REAF organizou a consulta regional das Diretrizes na América do Sul a pedido do Comite de Segurança Alimentar Mundial e estimulou os paises que dela participam a apresentar contribuições ao documento. Depois da aprovação das Diretrizes, a REAF impulsionou iniciativas de difusão e de intercambio entre os paises e iniciou um processo de monitoramento regional da aplicação das Diretrizes nos paises do MERCOSUL. O primeiro passo foi a elaobração de informes nacionais que foram compilados em um primeiro informe regional que foi, recentmente, submetido às instâncias superiores do MERCOSUL. A intenção não é fazer uma comparação entre os países, mas valorizar e analisar o que vem sendo feito em cada país à luz dos princípios e dos dispostivos das Diretrizes. A apresentação dos informes nacionais no espaço regional permite uma socialização das realidades e o compartilhamento dos desafios e de iniciativas bem sucedidas, e, ainda, organizar ações de cooperação bilateral, de intercambio, incluindo atividades com a sociedade civil e gestores governamentais.

Nessa experiência as Diretrizes tem sido tratadas como uma ferramenta para garantir os direitos das comunidades rurais à terra, melhorando o marco legal e as ações do Estado, como parte do grande desafio de garantir a segurança alimentar e o desenvolvimento sustantável.

Submitted by Caio Galvão de… on Tue, 11/21/2023 - 13:37

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As observações de Madi indicam um bom caminho para constituir um instrumento nacional de implementação e monitoramento das Diretrizes.

Um aspecto importante das Diretrizes, e que explica muito de seu conteúdo, é que ela foi elaborada e discutida no Comite de Segurança Alimentar Mundial (CSA) após sua reforma que criou novos procedimentos e mecanismos de participação. Dessa vez a participação da sociedade civil e do setor privado não se deu apenas nos momentos das consultras públicas como costuma acontecer nos foruns insternacionais. A participação se deu em todo o processo, inclusive, na negociação de todo o seu conteúdo o que deu legitimidade e força política para as Diretrizes, além de garantir avanços importantes em seu conteúdo.

A mesma participação tem que ser garantida agora, seja no ambito do CSA para definir o metodo de monitoramento, seja nos paises para organizar sua implementação. E as Diretrizes trazem recomendações claras sobre isso. Um dos principios para sua implementação é exatamento o da consulta e da participação, que orienta que se assegure "a participação ativa, livre, eficaz, significativa e informada de individuos e grupos nos processos correspondentes de tomadas de decisões". Outros princípios destacam a necessidade da transparência e da prestação de contas (Diretriz 3B, itens 6, 8 e 9).

Além disso, as Diretrizes orientam os Estados a "criar plataformas e marcos multissegmentados, em nível local, nacional e regional, ou utilizar os já existentes [como no caso o Consan], a fim de colaborar na execução (...) monitorar e avaliar a implementação". A participação deverá se dar em um processo "integrador, participativo, sensível às questões de gênero" e para isso os Estados podem solicitar apoio técnico a órgãos regionais e internacionais" (Diretriz 26.2).

A participação nessa plataforma que, em geral, conta com a presença de órgãos do Estado e diferentes setores da sociedade não é incompatível com a criação de espaços próprios da sociedade civil. Nestes espaços, a sociedade civil pode desenvolver iniciativas autonomas de difusão e monitoramento das Diretrizes e preparar sua atuação na plataforma multiatores nacional.

As experiências da Plataforma Camponesa e da REDSAN na CPLP mostram claramente como pode se combinar de forma virtuosa o funcionamento de espaços próprios de organização e discussão com a participação nos fóruns gerais da comunidade.

 

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A segurança alimentar e a erradicação da fome estão, na maioria dos casos, diretamente relacionadas com o acesso à terra e outros recursos naturais e, portanto, à eficiência dos modelos específicos de governança da terra adotados em determinado território. O reconhecimento dessa relação e a sua universalização é materializado nas Diretrizes Voluntárias de Governança Responsável de Terras, Pescas e Recursos Florestais no contexto da Segurança Alimentar Nacional (VGGT), aprovadas pelo Comité Mundial de Segurança Alimentar (CFS) em Sessão Especial em Maio de 2012.


 



Alguns princípios-chave


Princípio 1: Plataformas multi-atores inclusivas.


Princípio 2: Reconhecimento dos direitos consuetudinários e da posse informal.


Princípio 3: Igualdade de género.


Princípio 4: Proteção contra a apropriação de terras.


Princípio 5: Administração efetiva de terras.


Princípio 6: Mecanismos de resolução de conflitos.

 


A implementação e a adoção efetiva desses princípios exigem, como mencionado no documento, que "todas as partes, incluindo as organizações da sociedade civil e o setor privado, sejam encorajadas a usar esforços colaborativos para promover e implementar essas Diretrizes de acordo com as prioridades e contextos nacionais. Todas as partes são encorajadas a divulgar informações sobre a governança responsável de posse da terra, a fim de melhorar as práticas. “(FAO / CFS, Parte 7, 26.5, p.44, Roma, 2012).


Esta perspetiva foi reforçada na 43ª Sessão do CFS realizada em Roma de 17 a 21 de outubro de 2016. Entre outras decisões e recomendações relevantes, o CFS 43 aprovou os Termos de Referência para compartilhar experiências e boas práticas na aplicação das decisões e recomendações do CFS  (em inglês). Na primeira sessão temática global sobre o acompanhamento da implementação das VGGT foram apresentadas e discutidas Experiências e boas práticas na utilização e aplicação das orientações voluntárias sobre a governação responsável da posse de terras, pescas e florestas no contexto da segurança alimentar nacional (VGGT) [1] (em inglês), estabelecendo um caminho para a adoção geral e efetiva promulgação das VGGT, seguindo cinco áreas complementares de intervenção:


Desenvolvimento de plataformas multi-atores: Focada no estabelecimento de plataformas permanentes institucionalizadas, que são vistas como um meio de garantir a efetiva implementação das VGGT.

Sensibilização: Focada na sensibilização de uma vasta gama de partes interessadas nas VGGT e em questões de governação da posse da terra, especialmente a sociedade civil e os governos.

Desenvolvimento de capacidades: Focada no reforço da capacidade das partes interessadas em implementar as VGGT. Fortemente ligada à sensibilização e dirigida a uma vasta gama de partes interessadas, particularmente a sociedade civil, líderes de comunidades e governos afetados por questões relacionadas com a posse de terra.

Operacionalização das VGGT: Focada na implementação, promovendo o uso prático das VGGT e ajudando as comunidades a garantir os direitos à terra.

Reforma dos quadros jurídicos e políticos: Centrada na integração das VGGT nos quadros políticos e jurídicos nacionais.ESAN-CPLP). Esta estratégia centra-se na melhoria dos sistemas de governação em matéria de segurança alimentar e nutricional a vários níveis e com vários intervenientes (nacionais / regionais); em prestar apoio imediato e sustentável às populações vulneráveis (proteção social); em promover o desenvolvimento de modelos sustentáveis de produção de alimentos, com processos de processamento e distribuição implementados pelos agricultores familiares.


A estrutura de governação multinível e multiatores definida para coordenar a implementação da estratégia, baseia-se no Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional da CPLP. O CONSAN é uma plataforma regional multiatores de diálogo ministerial e convergência a nível ministerial. Esta plataforma regional orienta a implementação da Estratégia de Segurança Alimentar e Nutricional (ESAN) e está ligada aos Conselhos Nacionais de Segurança Alimentar e Nutricional ou a Plataformas multiatores equivalente de cada Estado membro da CPLP. No seu contexto, foram criados grupos de trabalho temáticos específicos a nível regional ou nacional, a fim de elaborar propostas concretas de políticas e programas a aprovar pelos Conselhos regionais e nacionais, nomeadamente o Grupo de Trabalho da Agricultura Familiar [2], que detém um papel central nas questões de Governança da Terra.


O Pacto para a Melhoria da Governança da Terra na CPLP[3]


Em Setembro de 2016, no âmbito do FAFSAN II - CPLP (II Fórum sobre Agricultura Familiar e Segurança Alimentar e Nutricional na Comunidade de Países de Língua Portuguesa) em Lisboa, o Mecanismo de Facilitação da Participação da Sociedade Civil no CONSAN-CPLP (MSC-CONSAN) convidou outras partes interessadas (Universidades, Parlamentares, Setor privado, Embaixadores e representantes da Presidência do CONSAN) para discutir alternativas no sentido de melhorar a governança da terra nos países membros da CPLP. Após uma frutuosa discussão, foi acordado estabelecer um Pacto para implementar as VGGT e melhorar a Governança da Terra. Para orientar a sua execução, deverão ser implementados os seguintes processos:


1- Produção de Relatórios Nacionais de Governança da Terra pelo Secretariado Nacional do Conselho do Segurança Alimentar e Nutricional e organizações congéneres de cada país; Os relatório serão baseados nas contribuições fornecidas por todas as partes interessadas relevantes e deverá ser discutido e aprovado anualmente numa reunião específica do Conselho. Em países onde ainda se encontrem em implementação os Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, outros mecanismos de intervenientes múltiplos deverão ser utilizados, como em Moçambique, onde existe o Fórum de Consulta sobre Terras, ou em Angola, onde o governo se encontra a instalar um mecanismo para este fim envolvendo todas as partes abrangidas pela Agricultura familiar.


2- Os Relatórios Nacionais serão enviados ao CONSAN - CPLP, permitindo que o seu secretariado produza um Relatório Regional que será discutido e aprovado a nível regional.


3- O Relatório Regional será partilhado com outros países membros do CFS durante uma componente específica da agenda das sessões do CFS.


Espera-se que a elaboração deste relatório seja um processo que mobilize todas as partes interessadas. Por conseguinte, devem ser promovidas atividades de sensibilização e de reforço das capacidades. Simultaneamente, é necessário melhorar os conjuntos de dados sobre terra a fim de apoiar a recolha e utilização de dados.


É de realçar que a FAO reconhece a importância desta abordagem para a operacionalização eficaz das VGGT no caminho da Agenda de 2030 para a consecução dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.


 



Diretrizes para o Apoio à Agricultura Familiar nos Estados-Membros da CPLP


[Parte 3. Acesso à terra, ponto 3.1]


“os Estados-Membros, em colaboração com outros atores relevantes, devem prioritariamente aplicar de forma progressiva as Diretrizes Voluntárias para a Governança Responsável da Terra, dos Recursos Pesqueiros e Florestais no contexto da Segurança Alimentar Nacional e elaborar relatórios de acompanhamento nacionais, no âmbito dos Conselhos Nacionais de Segurança Alimentar e Nutricional.”


Versão 2.0, p. [10], em revisão, 2016

 


Objetivos do Pacto e resultados a alcançar


O objetivo geral do Pacto consiste na implementação das Diretrizes e melhorar a Governança da Terra nos países membros da CPLP. Isto será conseguido através do desenvolvimento de sistemas inclusivos de dados abrangentes relacionados com a terra e pelo desenvolvimento de um quadro de monitorização para as Diretrizes. Para que isso aconteça, os membros dos Conselhos Nacionais e o Grupo de Trabalho da Agricultura Familiar têm de ser qualificados para desenvolver sua capacidade de vincular fontes multilaterais de dados, informações e documentos e avaliar e relatar a implementação das Diretrizes.


A disponibilidade de dados, informações e documentação de qualidade é uma função-chave que será fornecida pelos conjuntos de dados existentes sobre governança de terras, alojados em portais como o Land Portal, e outros. A implementação do Pacto também melhorará a avaliação da aplicação das Diretrizes a partir de dados descentralizados, envolvendo todas as partes interessadas, incluindo as mais vulneráveis, eventualmente recolhidas com uma www.app e seguindo uma metodologia participativa para estruturar relatórios locais, nacionais e regionais, devendo levar em conta os trabalhos sobre recolha de dados de avaliação descentralizada das VGGT já realizados, por exemplo, pela ActionAid e pela FIAN International.


Isso permitirá que as partes interessadas discutam e fortaleçam a convergência de políticas para reformar os quadros jurídicos e de políticas de recursos naturais existentes nos países membros da CPLP, melhorando assim a Governança global de terras na CPLP.


A implementação do Pacto envolverá, principalmente, os participantes do Grupo de Trabalho da Agricultura Familiar (GT AF-CONSAN / CPLP) [4] do CONSAN, bem como de outros atores relevantes de diferentes categorias sociais (sociedade civil, setor privado, parlamentares, academia, governo e autoridades locais), que participam nos conselhos nacionais e regionais de segurança alimentar e nutricional, e estruturas equivalentes de governança fundiária nos países membros da CPLP.


A sistematização das informações geradas permitirá o estabelecimento formal de um Observatório de Governança da Terra na CPLP, bem como a eventual nomeação, por todos os atores relevantes, de um Relator / Provedor de Governança da Terra, garantindo assim a sustentabilidade geral do processo.


 


Conclusão


Em Setembro passado (2016) foi dado o primeiro passo para a construção e consolidação do Pacto para a melhoria da Governança da Terra na CPLP. Trata-se de um caminho longo, de que este debate faz parte integrante, que terá uma fase decisiva para o seu arranque institucional na II Reunião Extraordinária do CONSAN-CPLP, que decorrerá a Junho deste ano (2017) em Brasília.


Do debate aqui realizado podemos concluir que é necessário criar um sistema em que todos os eventos, fontes de informação e dados fidedignos sobre o uso e a administração atual da Terra na CPLP possam ser analisados, promovendo declarações e posicionamentos informados, e dando origem a Políticas e Legislação adequadas para o cumprimento das Diretrizes para o apoio à Agricultura Familiar nos Estados membros da CPLP, conforme aprovadas pelo CONSAN.


A sustentabilidade deste processo reside na consolidação e monitorização de acordos de política de Governança da Terra envolvendo a convergência dos países membros da CPLP com as políticas globais previstas, determinando que a CPLP e os seus Estados-Membros devem incluir este objetivo de Melhorar a Governança da Terra nos orçamentais regulares do Conselho Regional CONSAN-CPLP e dos Conselhos Nacionais e órgãos equivalentes. A eventual constituição de um Observatório de Governança da Terra e do repositório de informações obtido e acumulado poderá beneficiar do apoio de outras entidades intermediárias através das informações assim disponibilizadas. No entanto, este caminho em direção à plena autonomia na elaboração dos Relatórios de Governança da Terra na CPLP requer um esforço inicial de capacitação, bem como apoio organizacional.


 


Convergência global


 


A consolidação deste Pacto permitirá monitorar efetivamente a Governança da Terra e a adoção das VGGT na prática dos países membros da CPLP, evidenciando boas práticas na consolidação estrutural dos processos de convergência da política de segurança alimentar e nutricional em curso na CPLP com as políticas globais, incluindo a implementação de decisões e recomendações do CFS e da Agenda 2030 para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.


 


 

[1] In: CFS 2016/43/8, July 2016, p. 4-5; htOp://www.fao.org/3/a-mr218e.pdf


[2] “O Grupo de Trabalho de Agricultura Familiar do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CONSAN-CPLP), adiante GT AF, ressalta a contribuição fundamental da Agricultura Familiar para o desenvolvimento sustentável dos países da CPLP, onde cumpre um papel central na produção de alimentos seguros e saudáveis, no emprego agrícola, na geração de renda, na diversificação de culturas, na gestão da terra, água, florestas e outros recursos naturais e na protecção e promoção da agrobiodiversidade e de conhecimentos tradicionais associados. "; Em: DECLARAÇÃO DO GRUPO DE TRABALHO DE AGRICULTURA FAMILIAR DO CONSAN-CPLP | Brasília, DF - Brasil, 26-29 de Maio de 2014


[3] O Pacto para a Melhoria da Governança da Terra na CPLP é um processo de convergência de políticas em curso que liga a Sociedade Civil, o Sector Privado, a Academia, os Parlamentares e os Governos dos países membros da CPLP.


[4] GT AF-CONSAN/CPLP: Trata-se de um grupo multiatores "ad hoc", que reúne representantes da sociedade civil, universidades, setor privado, municípios, parlamentares e governos da CPLP, encarregados de desenvolver propostas concretas de políticas e programas a serem discutidas e aprovadas pela CONSAN-CPLP no domínio da agricultura familiar e do acesso aos recursos naturais. Os relatórios nacionais sobre governação fundiária e sobre a operacionalização das VGGT serão realizados por este grupo de trabalho.


Submitted by Nicinha Porto on Tue, 11/21/2023 - 13:37

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Os debates e elaborações relativos à governança fundiária e à construção de agendas internacionais de políticas voltadas ao desenvolvimento devem necessariamente buscar a solução para problemas estruturais da humanidade como, a concentração das terras, os problemas ambientais e a fome no mundo.

Nestas discussões, tem sido cada vez mais relevante o reconhecimento do papel da agricultura familiar e camponesa como o setor que pode responder pela produção de alimentos saudáveis, geração de empregos e ocupações produtivas, proteção da biodiversidade e para a produção e reprodução da vida no campo, assegurando a construção e valorização das identidades étnico-culturais. Esta visão sobre o papel da agricultura familiar questiona a priorização do agronegócio monocultor, extrativo e exportador, que compreende o campo apenas como local para aumentar suas riquezas, sem qualquer preocupação com o abastecimento alimentar da população e nem em resguardar os bens da natureza.

No entanto, mesmo com avanços importantes na defesa da terra como local de produção e reprodução da vida, intensifica-se a concentração deste bem pelo capital no mundo inteiro, num brutal processo de privatização que resulta na expulsão das populações locais e no agravamento das históricas situações de degradação, violência, êxodo rural e migrações.

A apropriação das terras, territórios e demais bens comuns pelo capital vem ocorrendo de diversas formas, como: pela intensificação do controle de áreas públicas por tradicionais mecanismos de grilagem, ou pela obtenção de concessões de uso em contratos de longuíssimo prazo com renovações indeterminadas; a compra de terras dos pequenos e médios produtores; tomada de terras de populações indígenas, quilombolas e de outros povos e comunidades tradicionais e pela submissão dos agricultores familiares à lógica produtiva do agronegócio, dentre outras. 

O interesse internacional sobre o monopólio dos bens naturais resulta da intenção cada vez maior de exercer o controle sobre as principais demandas mundiais conhecidas como 4 F, que significam: Food - alimentos; Feed/Fiber – ração/fibras; Fuel – combustíveis/agro- energias e Forest – florestas/madeiras.  Também estão nesta lista de demandas, a exploração de minérios, de madeiras e o controle da água para consumo, produção de alimentos e energia.

O Brasil pela abundância de terras agricultáveis, água, florestas e minérios, está no centro deste interesse mundial, sendo disputado por grandes empresas, mineradoras, fundos de pensão e governos de países ricos, especialmente daqueles que possuem poucas terras agricultáveis e precisam de reservas para produção futura de alimentos.

Destaca-se que parte expressiva do parlamento e do atual governo brasileiro defendem a abertura total das terras ao capital internacional, sem se preocupar com as consequências desta medida que, somada à opção política de fortalecer a agricultura exportadora controlada pelas companhias transnacionais do agronegócio coloca a economia e o desenvolvimento brasileiro totalmente subordinado e influenciado pelo mercado global de commodities.

Vale lembrar que esta opção de desenvolvimento rural faz do Brasil um dos países com a estrutura fundiária mais concentrada e o que utiliza maior quantidade de agrotóxicos do mundo, sem contar a disseminação do uso da transgenia em quase todas as culturas mais relevantes.  Estas são estatísticas que afetam profundamente a vida, o trabalho, a renda, a saúde e as culturas dos povos do campo, da floresta e das águas, agravando as situações de desigualdade, desterritorialização, degradação ambiental e de exclusão social e produtiva, ocorrências que afetam também as cidades e o conjunto da sociedade.

Este contexto é reforçado pelas históricas alianças entre os setores do agronegócio, da mineração e da exploração florestal com o capital financeiro, as empresas transnacionais, os meios de comunicação, e as representações do Estado que impulsionam a privatização e o controle sobre as terras, águas, florestas e sementes. 

Uma das expressões desta aliança se dá pelo apoio financeiro, político e institucional à criação de grandes projetos que se destinam à produção de commodities ou para instalação de infraestrutura, que não consideram os impactos obre as populações locais e o meio ambiente.

Outra estratégia de articulação entre o Estado e o agronegócio se dá, também, na tentativa de isolar, enfraquecer e desacreditar os movimentos sociais perante a sociedade, criminalizando as lutas, as organizações e as lideranças. Para tanto, se utilizam de diversos mecanismos de repressão e intimidação, além da promoção de campanhas na mídia, visando influenciar negativamente, a opinião da população sobre a reforma agrária.

Destaca-se, ainda, que a lógica produtivista do agronegócio impacta profundamente na produção de alimentos, especialmente porque a cada ano se ampliam as áreas plantadas com as principais monoculturas para exportação, enquanto se reduz, drasticamente, o plantio das culturas básicas do cardápio da população brasileira, como o feijão, arroz e mandioca. A diminuição destas áreas deixa a produção de alimentos totalmente suscetível ao mercado externo e vulnerável às mudanças climáticas.

Segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento-CONAB, na safra 2015-2016, enquanto a produção de soja, que é o produto mais evidente do agronegócio brasileiro, ocupou em torno de 33 milhões de hectares, que corresponde a mais de 49 % da área plantada em grãos no país, a produção de feijão não chegou aos 3 milhões de hectares e a de arroz foi inferior a 2 milhões de hectares. Na mesma linha, a área plantada com cana-de-açúcar ocupou mais de 9 milhões hectares e a de milho 15 milhões de hectares. Este fato se reflete no desabastecimento, no descontrole dos preços dos produtos alimentares e no aumento da inflação.

Mais grave é que, ao mesmo tempo em que o agronegócio se fortalece e se aprofundam os processos de concentração e privatização das terras e dos bens da natureza, ocorre uma redução drástica da intervenção do estado na realização das ações de reforma agrária, na demarcação de terras indígenas, reconhecimento de territórios quilombolas, regularização de pequenas posses e na criação de Unidades de Conservação. Nos últimos 10 anos a média de famílias assentadas caiu de mais de 76 mil, para 25 mil famílias/ano e, no ano de 2016 apenas 2.016 famílias foram assentadas, segundo os dados do Incra.

Uma medida positiva é que, para apoiar o desenvolvimento dos projetos de assentamento, nos últimos anos foram implantadas algumas políticas públicas importantes que, mesmo insuficientes, contribuíram para a melhoria das condições de vida, trabalho e renda das famílias assentadas, destacando-se, dentre outras, o Programa de Aquisição de Alimentos-PAA e o Programa Minha Casa Minha Vida Rural.

No entanto, a partir do golpe parlamentar que conduziu Michel Temer ao poder vem ocorrendo a paralisação da maioria das ações, com sérios retrocessos nos direitos e conquistas constitucionais e o desmonte das políticas públicas e das estruturas de Estado voltadas à reforma agrária e ao desenvolvimento rural sustentável.

Este cenário impõe ao movimento sindical e demais movimentos sociais a ampliação e o fortalecimento das lutas pela terra que, mesmo sendo permanentes, ainda não conseguiram construir um ambiente de mobilização social capaz de alterar os rumos do modelo dominante de desenvolvimento rural.

Neste contexto, é essencial compreender que as disputas pela posse da terra e pelo modelo de produção, não dependem apenas de questões locais e, muito menos, dos esforços isolados dos agricultores e agricultoras familiares preocupados em concorrer num mercado totalmente dominado pelo agronegócio e pelas grandes empresas.

Para que a agricultura familiar e camponesa assumam papel estratégico para o futuro da humanidade é necessário que, além de ampliar as políticas públicas para o seu fortalecimento, sejam garantidas políticas de reforma agrária que ampliem os direitos de acesso e de permanência na terra para as populações sem terra e para todos os povos do campo e da floresta. O direito à terra e ao território são direitos básicos para a existência,  ampliação e o fortalecimento da agricultura familiar e camponesa.

Na perspectiva de transformar estas áreas em territórios que se contraponham à lógica destrutiva e excludente do agronegócio, é imprescindível, ainda, avançar na compreensão pela sociedade e os governos sobre o papel prioritário que deve ser assumido pelos assentamentos e pela agricultura familiar, que é o de assegurar a produção de alimentos saudáveis e a preservação da biodiversidade.

Neste contexto, é fundamental que o debate e as articulações sobre a GOVERNANÇA DA TERRA identifiquem, fomentem e fortaleçam as iniciativas organizacionais e assegurem a implantação de políticas públicas que promovam a democratização do direito à terra, priorizem a agroecologia e garantam condições de trabalho, renda, produção, comércio e qualidade de vida para os povos do campo, da floresta e das águas.

 

Nicinha Porto – Assessora de Reforma Agrária da CONTAG

Brasília, 12 de maio de 2.017

Submitted by Adriana Silva on Tue, 11/21/2023 - 13:37

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Olá a todos,

De facto, os comentários tecidos pelo professor Bastiaan estão muito bem explicítos e demonstram a relação entre o desenvolvimento económico e a governança de terras.

Embora não seja atual, a entrevista a Sofía Monsalve, neste link: http://radiomundoreal.fm/Perfurando-o-silencio-global-sobre?lang=es, demonstra que se conseguir protejer a posse dos recursos naturais por parte dos trabalhadores e trabalhadoras rurais, é possível assegurar uma diminuição da criminalidade, contribuir para a segurança alimentar e nutricional das comunidades e, claro, assegurar o desenvolvimento económico.

Este esforço só é conseguido quando há a devida articulação do sector privado com os Governos e com a sociedade civil, havendo uma distribuição equitativa dos benefícios. Isto implica, claro, não lesar nenhum dos actores e primar pela preservação do ambiente, dos recursos naturais e das comunidades.

Mais, quando há uma falha na distribuição destes poderes e capacidades, o sector agrícola, mais propriamente os agricultores e agricultores saem sempre em situação desvantajosa, o que é muito preocupante a uma escala global, uma vez que grande parte da população dos países em desenvolvimento depende do sector primário.

Provavelmente não serei das pessoas mais entididas na matéria, mas creio ser fundamental assegurar que este garanta impactos de longo prazo, duradouros e eficazes, essencialmente para as comunidades locais.

 

Submitted by Salimo Abdula on Tue, 11/21/2023 - 13:37

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Importância do quadro institucional para participação dos atores na governança da terra, para construir pontos de concordância e sinergias: “Faz parte da Estratégia da Confederação Empresarial da CPLP, o sector agroindustrial, que é o sector principal que elegemos como um dos fatores principais para desenvolver o sector económico e também social a nível dos países de expressão portuguesa. Tendo em consideração o que temos afirmado sobre o crescimento populacional da classe média a nível mundial, precisa de se alimentar mais e melhor e a CPLP pode olhar para este fator não só como um aspeto social mas também económico”

“É uma grande oportunidade para intervenção das empresas nos nossos países com uma combinação de esforços, para países como Portugal, Brasil que têm mais tecnologia e os outros países dos PALOP como angola e que precisam desta tecnologia para trabalharem a terra que abunda, mas vale zero se não for produtiva.”

“Acho que as organizações existentes, regionais e locais, devem ser utilizadas da melhor forma para não proliferarem outras instituições onde vamos queimar só tempo, energia e recursos que são escassos e podemos maximizar aproveitando todos os atores intervenientes neste processo para poderem sempre dar mais um passo e avançar para o grande objetivo que queremos: maximizar o tempo, maximizar os recursos existentes e sermos certamente uma comunidade que vai oferecer a este planeta uma solução alimentar e uma solução social também”

“Temos que crescer comercialmente, temos que usar a terra, mas de forma responsável. O passado pode ser o grande professor. Podemos minimizar os impactos negativos que foram utilizados anteriormente. Hoje as tecnologias podem ser mais previsíveis para que possamos fazer uma agricultura mais responsável, mais amiga do ambiente, mas que possa também maximizar, dentro dos PALOPs este grande recurso que temos que é a terra.

Há que haver transparência na concessão dos espaços para produção. É crucial para os países que detém grandes espaços territoriais e que os querem usar para a produção agroindustrial, devem mapear e ter de forma bem organizada aquilo que são as zonas de produção agrícola industrial, aquilo que é para produção familiar, para que haja transparência na aquisição. O sector privado quando chega quer pagar, quer produzir, quer maximizar o seu tempo. Não pode andar à procura e a perder tempo porque depois entramos num sistema corrupto em que saímos todos a perder. Portanto, os produtos saem mais caros, não há investidores sérios e entramos no que não queremos. Queremos é que haja um espaço transparente, transversal, onde todos possam produzir de forma legal, contribuir com as suas contribuições fiscais e provoque o desenvolvimento social.

Submitted by Vicent Garces on Tue, 11/21/2023 - 13:37

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“É conhecido como as políticas de reforma agrária, que decorreram em todo o planeta no século XX, a finais do século XX desapareceram do cenário internacional na medida em que há medidas de orientar a sociedade e de redistribuição da terra, facilitar o acesso à terra para os camponeses no campo ou com pouca terra “que permitiram a produção agrícola suficiente para a alimentação do país.”

As últimas décadas caracterizam-se pelo rápido desenvolvimento tecnológico e pelo forte incremento na utilização de combustíveis fósseis, resultando numa extensão generalizada das economias de mercado. Contudo, também emerge uma revolução financeira que resulta na compra de uma grande quantidade de terras. Portanto, a transformação das estruturas agrárias pode resultar num decréscimo acentuado ou até na ausência de camponesas, já que as grandes empresas irão empregar os trabalhadores agrícolas. A este ritmo, é cada vez mais possível acabar com os camponeses, alterando e condicionado a sobrevivência da humanidade como a conhecemos.

“As políticas do mercado de terras substituíram as políticas da reforma agrária e modificaram a orientação para se irem submetendo cada vez mais à terra como mercadoria, como um valor para a inversão.”

“Em 2006, mais de 90 governos de todo o mundo subscreveram as conclusões da CIRADR (Conferência Internacional de Reforma Agrária e de Desenvolvimento Rural) de concordaram que era necessário reformular as políticas de redistribuição de terras, para fortalecer a agricultura, agricultura camponesa, agricultura familiar e a produção de alimentos. Foi dito também que é necessário fortalecer todos os mecanismos de articulação com a sociedade civil que permitam uma melhor conexão entre os grandes desafios e exigências da sociedade camponesa e as instituições públicas. Afirmou-se também que o papel das mulheres e dos jovens é fundamental para o desenvolvimento agrário e é necessário haver políticas ativas para limitar ou eliminar as restrições que diferenciam, em muitos países, a mulher do mundo rural, do homem e que limitam aos jovens o acesso às possibilidades de produção.”

Em 2016, constata-se que as políticas de redistribuição da terra foram praticamente abandonadas e as que foram estabelecidas não tomam em conta a realidade local das comunidades de base. A falta de acesso à terra e aos recursos produtivos continua a ser uma das principais causas da pobreza e da marginalização das populações rurais e do mundo. A apropriação por parte dos órgãos com mais poder das melhorares terras agrárias, da água, espaços florestais e pastorais, da pesca e das sementes leva ao aumento das desigualdades sociais e das dificuldades económicas.

Há mais de 30 anos que as grandes empresas agrícolas, atraídas pelos bons preços da terra e mão-de-obra barata ganham terreno em detrimento das pequenas explorações familiares e camponesas. “Assim, hoje, os recursos naturais são considerados como mercadorias em detrimento do meio ambiente, da soberania alimentar e do direito dos povos à alimentação”. As grandes empresas privadas continuam a beneficiar do muito baixo custo do acesso à terra, dos salários, dos recursos naturais, dos baixos salários e da ausência fiscal para gerar somente benefícios financeiros, não contribuindo, contudo, para uma maior eficácia agrónoma e económica, no que respeita a produção industrial.

Por outro lado, o foco na monocultura com utilização massiva de energia fóssil e de fertilizantes de origem industrial, com risco acrescido de contaminação de solos e água contribuem para a perda de biodiversidade, degradação ecológica e alterações climáticas. Mais, promove a persistência de fome e malnutrição, desigualdades crescentes entre países, exclusões sociais, violências estruturais, altos níveis de desemprego e fluxos migratórios. Esta situação é intolerável e afeta especialmente os povos indígenas, as mulheres e os jovens.

Por isso, as VGGT são decisivas para colmatar a falta de vontade política dos Estados e para assegurar a posse justa e legal de terra, o reassentamento de populações cujas terras tenham sido injustamente exploradas e não compensadas adequadamente, para corrigir as desigualdades no acesso à terra e aos recursos naturais, para reconhecer e garantir a participação eficaz das mulheres e dos jovens na tomada de decisões, estabelecer ferramentas de regulação para controlar a posse de terra, nomeadamente políticas fiscais, intervenção, venda ou arrendamentos em mercados de terras e promover a governança dos territórios , garantindo que as comunidades definam as regras e direitos de uso dos seus bens comuns e  modos de vida melhor conformados às suas preferências técnicas, ecológicas, económicas e culturais.

O acesso seguro à terra e aos recursos naturais depende da realização eficaz dos direitos humanos como: o direito à alimentação e nutrição adequada; o direito à água e ao saneamento; o direito à saúde; o direito à cultural; o direito à vivência e o direito ao trabalho.

Submitted by Henrique Pires… on Tue, 11/21/2023 - 13:37

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Para aprofundar o debate, junto o link para o video da 1ª Mesa Redonda do II FAFSAN, sobre Governança da Terra na CPLP, onde podemos assistir aos contributos de Vicent Garcéz - Presidente do Comité Internacional Organizador do Fórum Mundial sobre Acesso à Terra e aos Recursos NaturaisFrancisco Sarmento - na altura Consultor da FAO, Luís Muchanga - Coordenador Executivo da UNAC - União Nacional de Camponeses (Moçambique), membro da Rede de Organizações para a Soberania Alimentar (ROSA) de Moçambique e Representante do MSC-CONSAN, de Maria Rita Oliveira - Docente da Universidade Estadual Paulista (UNESP) do Brasil e Representante do Mecanismo das Universidades no CONSAN-CPLP, de Salimo Abdula - Presidente da Confederação Empresarial da CPLP e Representante do Mecanismo do Setor Privado no CONSAN-CPLP, de Xavier Mendes - Parlamentar (São Tomé e Príncipe) - Representante do Mecanismo dos Parlamentares no CONSAN-CPLP, e de Manuel Lapão - Diretor de Cooperação do Secretariado Executivo da CPLP.

Mesa redonda 1 - Governança da terra e outros recursos naturais

Na plateia, de entre outros intervenientes, referimos as contribuições de Margarida Alvim da FEC – Fundação Fé e Cooperação, de Boaventura Monjane – jornalista e ativista social em Moçambique; faz doutoramento no CES em Póscolonialismos e Cidadania Global no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, Portugal, tendo como área de pesquisa os Movimentos Sociais, questões agrárias e as alternativas desde a base. Fez parte da equipa de advocacia da UNAC (Moçambique), e de Marina Padrão Temudo – Investigadora do Instituto de Investigação Científica Tropical – trabalha com saberes, conhecimento, gestão recursos naturais, na Guiné, Moçambique, Cabo Verde, Angola.

Ver aqui: Mesa redonda 1 - Governança da terra e outros recursos naturais

Submitted by Rui Jorge Alve… on Tue, 11/21/2023 - 13:37

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Na Guiné-Bissau a terra é um problema extremamente crucial no país. Não se pode neste momento falar em governação de terra porque a lei fundiária aprovada em 1998 até agora ainda não está a ser aplica, muito embora o governo tenha solicitado à FAO que fizesse a revisão do regulamento da lei. Esta já foi feita e entregue ao governo para que possa ser aprovada e assim começar a implementar essa lei. O documento permite a criação de diversas instituições que vão regular a questão de terra.

Neste momento a governação de terras não existe. Quando se quer investir o investidor vai junto às aldeias, contacta o chefe da aldeia e ele vê o espaço que está livre ou não e concede esse terreno. Depois vai à administração regional e faz as escrituras. Muitas das vezes, essas terras podem ser de alguém dos antepassados das famílias e poderãoexistir conflitos.

Outra questão são os problemas que existem entre duas aldeias. Portanto, há terras que pertencem a duas aldeias, uma reivindica uma parte e no final criam-se conflitos, muitas vezes com vítimas mortais.

No que respeita o acesso à terra das mulheres, elas não têm direito a posse de terra. Mesmo sendo viúva, não pode herdar a terra deixada pelo marido.

As VGGTs foram aprovadas pela FAO e com este projeto procura fazer-se a implementação das diretrizes no país e como é que a questão de governança pode ser abordada melhor no país. O projeto tem diversas vertentes, sendo uma delas o reforço das capacidades de as instituições trabalharem à volta da terra. Dentro do regulamento da lei está prevista a criação das comissões fundiárias a nível nacional, das regiões e sectoriais. Uma das componentes do projeto é reforçar essas comissões que vão gerir a questão da terra. As terras comunitárias não estão delimitadas, identificadas ou cadastradas. Então é necessário que isso seja feito para que posteriormente haja melhor controlo de acesso e posse de terra.

Outro elemento é o reforço da capacidade da estrutura dos impostos, para que seja aplicado o imposto sobre a terra. Neste momento não se paga praticamente imposto sobre a terra (montante muito pequeno que é pago) e mesmo assim muitos proprietários não pagam e não cumprem com o dever de o pagar. Portanto, o projeto permite criar mecanismos para que se possa criar um observatório fundiário de terra para que possa recolher todas as informações ligadas a tudo do fundiário na Guiné Bissau.

A comunicação, a troca de informação entre os diversos atores a nível nacional, a nível regional e internacional permite ver qual o avanço nesta questão de governança da terra e trocar as experiências que poderão existir. As informações têm de ser vinculadas e aplicadas nas comunidades porque são elas que têm o saber, o conhecimento e o poder de trabalhar a terra. Todo este processo terá que ser divulgado e partilhado a nível internacional para melhorar o acesso à terra na Guiné Bissau.

Submitted by Madi Fati on Tue, 11/21/2023 - 13:37

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1.Na Republica da Guiné-Bissau a terra e’ propriedade do Estado e património comum de todo o povo.

2.A terra como suporte físico fundamental da comunidade e’ valor eminentemente nacional, qualquer que seja a forma da sua utilização e exploração.

3.Os direitos constituídos sobre a terra e sobre os recursos naturais importam em igual protecção quer resultem do costume, quer da lei.

 

Como se pode entender a lei fundiária do nosso país é extremamente controversa e deixa lamentavelmente um campo aberto para o surgimento de muitos conflitos de posse de terra. Os conflitos fundiários são frequentes tanto nas zonas rurais como nos centros urbanos. Os casos mais graves são os conflitos que opõem os Agricultores contra os criadores de gado.  

Na Guiné-Bissau o grupo étnico fula é criador de gado por excelência. Os fulos são uma população islamizada e vivem fundamentalmente no leste do país (Regiões de Gabú e Bafatá). O leste é uma zona agrária árida ou aquilo que chamamos contexto saheliano. Eles são detentores de maior número de cabeça de gado. No entretanto a zona leste devido as condições de aridez climática o gado confronta-se com graves problemas de alimentação. Isto obriga a população fula a praticar a transhumancia do gado. Nessa pratica da transhumancia o gado é movimentado do leste para a Região de Oió a procura de pastagem. Nessa movimentação o gado frequentemente passa pelos arrozais de grupos étnicos balanta. Os balanta e fulas opõe uns contra outros e os conflitos fundiários (travessia de arrozais) tem originado confrontos físicos que culminaram em espancamentos até a morte. 

O foco das violências entre agricultores e criadores de gado é frequente no norte na Região de Oió (Gã- Mamudo, Bissorã)  

Em Bissau no bairro de Gabúsinho surgiu um conflito de terra entre um estrangeiro e alguns moradores deste bairro.

O estrangeiro adquiriu um espaço de terra através de um ocupante tradicional e aproveitou a documentação para legalizar esse espaço. Ele não tendo no imediato intenção de construir nessa localidade deixou o terreno com plantação de cajueiros e regressou para o seu país. Quando voltou anos depois deparou com a situação de ocupação do seu terreno com construção de habitações de tipo precário. Ele fez recurso á Instancias judiciário e ganhou a causa. As autoridades (Câmara Municipal de Bissau, Policia Judiciaria) deram ordem de despejo aos ocupantes e posteriormente mandaram demolir essas habitações. Isto aconteceu em 2016. Há casos de violência frequentemente que por vezes são fatais.

O desfecho dos conflitos termina normalmente com a intervenção das autoridades costumeiras locais que de princípios de solidariedade comunitária conseguem persuadir as partes para uma solução negociada tradicionalmente.